quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

A Economia e a Revolução: Por uma Teoria Marxista do Desenvolvimento Econômico-Social e da Dinâmica Capitalista

Por Almir Cezar Filho

Quero, antes de tudo, reinterar meu compromisso com a construção com o Marxismo, na prática e na teoria, porém descobri que o Marxismo, digo o marxismo ortodoxo (no sentido dado por Lukács), possui duas lacunas perigosas deixadas por nossos fundadores, Marx e Engels, e que os pensadores clássicos marxistas (Lênin, Trotski, Rosa Luxemburgo, etc) não conseguiram ou não identificaram ou não tiveram tempo para cobrir. Lênin conseguiu, por exemplo, preencher a lacuna de uma teoria do Estado, através de seu "O Estado e a Revolução", mas há outras.

As lacunas que descobri, na verdade, foram-me apresentadas por um autor francês que li recentemente, Lâcome, e de um debate com dois professores do Mestrado e uma conversa que tive com um amigo o qual debato muita teoria marxista. As lacunas permitem uma série de ataques dados por correntes burguesas ou pequeno-burguesas e confusões que abrem flanco para revisionismos. A primeira lacuna, e a que eu acho mais grave, é a respeito de uma teoria marxista do desenvolvimento econômico.

Um professor no Mestrado apresentou um conceito geral para desenvolvimento, evocando Hegel mas com um viés marxiano, afirmando que "Desenvolvimento é o exercício de uma potência".  Critiquei a definição de desenvolvimento dada, apontando o equívoco hegeliano, da inversão da dialética, e a caráter muito abrangente da categoria. Mas ele replicou-me apresentando que era bem marxiana tal definição, e que os marxistas não desenvolveram a idéia de desenvolvimento social e econômico.

Brincando com um amigo, militante de esquerda e estudante de Geografia na UFF, perguntei a esse futuro geógrafo qual era o conceito de "desenvolvimento", ele emudeceu, dei o conceito dado pelo professor, e ele me perguntou qual era o conceito marxista. Aí fui eu que emudeci. Disse que não havia uma teoria do desenvolvimento.

Em verdade, procurei na biblioteca entre os livros e autores marxistas ou quase-marxistas, e nenhum, exceto revisionistas, neomarxistas e outras correntes (que importaram categorias ou conclusões marxistas) havia alguma elaboração sobre teoria do desenvolvimento econômico. O mais próximo foi apresentado pelos neomarxistas da escola norte-americana como Paul Sweezy e Paul Baran (livros como Economia Política do Desenvolvimento, Capitalismo Monopolista e Teoria do Desenvolvimento Capitalista), o co-fundador do keynesianismo Michal Kalecki (que não por acaso influenciou os norte-americanos). Nos clássicos revolucionários há muita coisa dispersa ou dissolvida, como Rosa, Lênin, Trotski (o que mais se aproximou consistentemente, embora diferente dos outros, o que menos colocou de maneira nítida nos textos). Lâcome afirma que o marxismo não elaborou uma relação entre nível de desenvolvimento e taxa de exploração.

Quanto ao segundo problema me chegou numa outra disciplina, onde um professor neoschumpeteriano disse que os heterodoxos não haviam uma crítica sistematizada consistente e formalizada sobre a teoria microeconômica (a determinação de preços, custos e remuneração dos fatores produtivos e a decisão dos agentes econômicos de comprar, produzir e gastar). Haviam críticas dispersas entre as diversas correntes, e os entre os marxistas há uma aparente horror em debate tal tema.

No texto de Lâcome ele justamente havia citado que era outro tema lacuna de Marx e Engels uma crítica a Microeconomia - também pudera ambos morreram ou antes ou durante as primeiras formulações dessa ciência. Os marxistas posteriores não trataram, ficando pior, na defensiva em torno da teoria do valor-trabalho questionado pelos neoclássicos microeconomistas no longo debate sobre a transformação dos valores em preços. Piero Sraffa refutou, mas apresentou uma saída não marxista, e sim pró ricadiana, e um pouco questionável (re-introduz o paradigma do equilíbrio).

Assim os marxistas ortodoxos têm um problema nas mãos, acrescido ao fato que a teoria marxista precisa atualizar sua visão sobre o Imperialismo e a velha controvérsia sobre a causa das crises econômicas, formularem uma agenda de pesquisa marxista ortodoxa no campo da economia política, e também da sociologia econômica.

Trabalho com algumas hipóteses e conclusões desde a elaboração da monografia. Devo ilustrar um fato antes. Um outro professor apresentou numa aula uma tabela de produtividades dos 5 países mais ricos (França, RU, EUA, Japão e Alemanha) por período de 1962-73, 1974-86, 1987-98. Mostrava um choque ou uma queda acentuada do 1o ao 2o período, de quase a metade e queda insignificante (<10%) ao 3o período. Perguntei que seria a causa de queda ou aumento de produtividade.

A periodização acompanhava a crise de 1973-74 (fim do padrão dólar-ouro, Choque do petróleo, etc), e ele confirmava a o motivo da divisão, e perguntei a luz de minha monografia - em torno dos economistas “regulacionistas” franceses (a “Terceira Via” européia) - se a crise gerava a queda de produtividade ou a queda havia gerado a crise. Ele se iluminou a disse que não saberia, e que seria um belíssimo tema de dissertação se abrimos os dados e investigando. Disse-lhe que naquele momento pelo desastre que foi a orientação da monografia que a princípio não me agradara à idéia. Sistematizei o que seria a princípio o meu programa de pesquisa, para desenvolver uma teoria marxista do desenvolvimento econômico, fazendo a obrigatória correlação entre taxa de exploração e nível de desenvolvimento e a questão da regulação pela lei do valor, compreende que uma marxista economia do desenvolvimento é uma economia da revolução.

Meu principal referencial será utilizar a análise marxista sobre desenvolvimento econômico apresentado por Eugenio Preobrazhenski, principal teórico econômico dos bolcheviques, e co-liderança juntamente a Trotski da Oposição de Esquerda contra a stalinização do regime. Esse autor expõe suas teorias especialmente no livro “Nova Econômica”, onde analisa o desenvolvimento da economia socializada na URSS nos anos 1920 e os limites e as alternativas da transição ao socialismo em país capitalista periférico. Também discorre sobre a dinâmica capitalista e a determinação dos elementos “microeconômicos”, apresentando conjuntamente a explicação das estruturas e modificações estruturais como conseqüências da regulação econômico-social oferecida pela lei do valor.

Fui apresentado a Preobrazhenski de duas maneiras diferentes. A primeira, em textos e cursos de formação marxistas à respeito da “Teoria da Revolução Permanente” (sua polêmica com Trotski obriga a esse formalizar essa teoria, e décadas depois, o marxista argentino Nahuel Moreno, incorpora suas críticas para atualizar essa Teoria, diante dos problemas que o movimento trotskista passou desde o pós-Segunda Guerra, sem precisar incorrer em um revisionismo).

A outra, lendo para confecção de minha monografia, textos que tratavam sobre as famosas controvérsias marxistas em torno da causa das crises e do problema da “transformação de valores em preços”, onde encontrei textos de João Antônio de Paula, da UFMG. Seus artigos permitiram-me criticar marxistamente a Escola da Regulação à medida que ele re-conecta o nexo da causa das crises na regulação da lei do valor ao mesmo tempo em que resolve a relação entre preços de produção e o valor-trabalho de uma maneira marxiana (sem usar os subterfúgios que os regulacionistas prendem-se). De Paula escreve explicitamente sobre a lei do valor com base a contribuição de Preobrazhenski dada em “Nova Econômica”. Porém, somente aqui em Uberlândia pude ler Preobrazhenski, obtive tempo e o livro na biblioteca.

 Ele apresenta uma excelente teoria do desenvolvimento simplesmente ao apresentar uma análise do desenvolvimento da economia pós-capitalista (“socialismo”) porque apreende na análise um princípio (embora o faça de maneira colateral ao adotar o método marxista, que a antecipação do desenlace das contradições é necessária à compreensão do movimento). O desenlace da contradição do movimento econômico histórico capitalista é a revolução e a economia sob controle do Estado Operário, assim o próprio “movimento” (as tendências, as leis, as dinâmicas, as estruturas e as modificações estruturais do capitalismo) é entendido a partir do seu “desenlace” (a revolução proletário e o socialismo).

  “A Economia e a Revolução”: Teses e tarefas
1-Não há uma teoria marxista do desenvolvimento econômico. As teorias não são marxistas ou apenas importaram/incorporaram elementos marxianos, em um grau menor ou maior, ou truncaram/ecletizaram a outras teorias.
2-Paul Sweezy e Paul Baran eram kaleckianos ou neomarxistas; há necessidade de um tratamento marxista ortodoxo.
3-Quanto ao tratamento marxista, mesmo que não necessariamente ortodoxo, não há formulação geral, abstrata e sistematizada sob a questão do desenvolvimento econômico (de maneira vasta e profunda). Vide os exemplos de Ernest Mandel e George Novack.
4-Uma Economia do Desenvolvimento marxista obrigatoriamente implica em ter ou acabar sendo uma “Economia da Revolução”.
5-Uma “Economia da Revolução” é, sem dúvida, uma Economia da transição ao socialismo.
6-Uma teoria marxista do desenvolvimento econômico não pode ser confundida com a Teoria do Imperialismo; essa é mais para Economia internacional ou das relações internacionais, econômicas e inter-estados sob o capitalismo monopolista.
7-Mas Economia da Revolução (ainda) não é uma Economia da organização da transição ao socialismo, isto é, a Teoria econômica da Economia sob a ditadura do proletariado. Em suma uma Economia da Conversão ao Socialismo
8-Assim a “Economia da Revolução” é uma Economia da transição, no aspecto de um a Economia da transformação do capitalismo em socialismo, da conversão e do período de conversão, inclusive da etapa de mundialização dessa conversão.
9-O Desenvolvimento Econômico é o “movimento” econômico histórico, de longo período, do capitalismo.
10-A Economia da Revolução não é apenas introduzir na Teoria Econômica o fenômeno sociológico da revolução social
11-Nem apenas verificar as leis econômicas que atuam na revolução.
12-Nem apenas analisar o impacto da revolução na formulação ideológica das teorias da Ciência Econômica
13-Nem verificar as modificações proporcionadas pela revolução nas estruturas econômicas.
14-Mas compreender que a “Economia da Revolução” é a Economia Marxista do Desenvolvimento Econômico. Entender o desenvolvimento econômico como desigual e combinado, ainda mais sob o capitalismo.
15-Incorporar o princípio do desenvolvimento desigual e combinado e a teoria da revolução permanente;
16-Entender o conceito que a “política é a economia concentrada” e resgatar que há determinação da economia (e não determinismo), mas há a supremacia da política.
17-Resgatar e atualizar a teoria do Imperialismo na época atual de capitalismo monopolista transnacional
18-Analisar impacto da superestrutura social sobre a estrutura econômica (forças produtivas e relações de produção).
19-Todas as teorias do desenvolvimento do Pós-Segunda Guerra foram (constituíram-se) a partir da teoria marxista ou de categorias ou conclusões marxianas. Ou, na hipótese menor, foram influenciadas pelo fenômeno do desenvolvimento soviético.
20-Analisar as mudanças que a teoria econômica sofreu impactada pelas revoluções proletárias do século XX.
21-Fixar e analisar as mudanças da economia (na dinâmica e na estrutura) operada pelas revoluções proletárias do século XX.
22-As experiências dos regimes pós-revolucionárias do século XX: o Estado de “Bem-estar Social” e os Estados Operários Burocratizados
23-Os governos e/ou regimes pós-revolucionários (social-democratas, stalinistas, nacionalistas, guerrilheristas) congelaram a revolução socialista.
24-As teorias do desenvolvimento elaboradas ao longo do século XX, tais quais as teorias da Economia Política, estavam sob o impacto das revoluções proletárias.
25-As teorias marxistas revisionistas erram sistematicamente ao identificar as causas da crise do sistema capitalista. Consequentemente não conseguem uma teoria consistente marxista, o que por sua vez não identificam a revolução como fim.
26-Entender que o reformismo contemporâneo só pode defender um “reformismo sem reformas”, ou pior, é defensor e aplicador de “contra-reformas”.
27-Que o capital revoluciona a si próprio no processo de valorização (revolução das forças produtivas e das condições de acumulação).
28- Analisar a dinâmica operacional do capitalismo e o conflito da regulação da lei do valor com o princípio do planejamento e o colapso (autocolapso) da lei do valor.
29-Analisar a “revolução do valor e gravitação dos preços” e a crítica marxista à Microeconomia e superação do problema de transformação pela aplicação do princípio da regulação pela lei do valor e do entendimento da dialética entre preços e valores.
30-Estabelecer qual o vínculo entre o nível de desenvolvimento e a taxa de exploração, deixada em suspenso por Marx e fundamental para analisar o “desenvolvimento” e a disparidade entre as nações.

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