sexta-feira, 23 de março de 2012

Indústria: 20% do vendido vem de fora. Atropelado pelo câmbio autopeças amarga déficit de US$ 4,6 bi. E MCT país ainda sofre cortes orçamentários.

Um em cada cinco produtos industriais consumidos no país ano passado foi importado. A informação é da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Não bastasse o déficit crescente, o setor de autopeças tornou-se quase totalmente estrangeiro. O nível de investimentos não acompanha produção de automóveis porque é mais barato importar. Mas o problema não vem de agora, a indústria, em especial de peças e maquinários se acomodou, e não se resume apenas ao câmbio. Contudo, agora o problema tornou contornos assustadores.

Por outro lado, o governo determinou severos cortes orçamentários sobre programas do Ministério da Ciência e Tecnologia, obrigando a selecionar projetos e "mendigar" junto as estatais. Porém, países líderes do setor de C&T, como EUA, Europa e Japão, mesmo em crise, têm apostado decididamente nos investimentos em ciência, tecnologia e inovação, estimulando a busca do conhecimento, o que explica o porque também são tradicionais líderes no setor industrial. Até o ministro do MCT reconhece que, essa é "uma marca de países que têm tido sucesso e querem continuar a exercer papel de liderança no mundo". Não abandonam jamais nenhum desses dois lados da moeda. É uma lição que a gente tem que tirar."

Indústria: 20% do vendido vem de fora
Monitor Mercantil, 19/03/2012 

Consumo de eletroeletrônicos importados foi um dos itens que mais cresceu

(Foto: Marcello Casal Jr.)
DESNACIONALIZAÇÃO DO SETOR DE INFORMÁTICA CHEGA A 51% E DE PETRÓLEO A 23%
Um em cada cinco produtos industriais consumidos no país ano passado foi importado. A informação é do estudo Coeficientes de Abertura Comercial, da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
De acordo com o documento, baseado no cruzamento de dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a participação de bens importados no consumo doméstico de produtos industriais alcançou nível recorde em 2011.
O coeficiente de ingresso de produtos importados aumentou dois pontos percentuais, entre 2010 e 2011, alcançando 19,8%.


O maior aumento foi verificado no setor de informática, eletrônicos e ópticos, que saiu de 45,4% para 51%, seguido por derivados de petróleo e combustível (de 17,8% para 23,3%); e máquinas e equipamentos (de 32,5% para 36,8%).
De 23 setores pesquisados, oito atingiram os níveis máximos da série histórica do coeficiente de penetração de importações, que começou em 1996.
A maior participação de importação ocorreu na extração de carvão mineral (87%); seguida pelos setores de extração de petróleo e gás natural (54,5%); informática, eletrônicos e ópticos (51%); outros equipamentos de transporte (37,3%); e máquinas e equipamentos (36,8%).
A pesquisa apurou ainda que as exportações de produtos industriais cresceram 19,8% em 2011, dois pontos em relação a 2010. Mesmo com o aumento, a fatia de participação está abaixo do recorde de 2004, de 22,9%.
"A grande maioria dos setores ainda apresenta coeficientes inferiores aos níveis máximos alcançados na década passada, com exceção de extração de carvão mineral e celulose e papel", destaca a CNI.

Atropelado pelo câmbio autopeças amarga déficit de US$ 4,6 bi
Rogério Lessa | Monitor Mercantil |  16/03/2012
"Não bastasse o déficit crescente, o setor de autopeças tornou-se quase totalmente estrangeiro. O nível de investimentos não acompanha produção de automóveis porque é mais barato importar". O comentário é do vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, para quem as poucas empresas brasileiras do ramo que ainda resistem, como a catarinense WEG, só sobrevivem porque são fornecedores para outros segmentos. "A antiga Cofap foi vendida para o Grupo Mahle, uma das 30 maiores empresas da indústria automotiva mundial. O mesmo ocorreu com a Metal Leve, entre outros diversos exemplos de desnacionalização", acrescenta o vice da AEB.
Já o Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores (Sindipeças) divulgou que, em 2011, a balança comercial do setor apresentou déficit de US$ 4,6 bilhões, o que representa alta de 30,9% em relação ao resultado de 2010. De maneira geral, as exportações avançaram 15,9%, enquanto que as importações cresceram 20,0%, na comparação com o ano de 2010. Isto porque, enquanto as exportações atingiram US$ 11,1 bilhões e as importações, US$ 15,8 bilhões. A média mensal das exportações foi de US$ 927,8 milhões e das importações, de US$ 1,3 bilhão.
No entanto, o economista Roberto Messenberg, do Instituto de Política Econômica Aplicada (Ipea), argumenta que o pior momento da desindustrialização se deu entre 1994 a 1998. "Agora, alguma desvalorização do real seria benéfica, mas não pode ser exagerada por causa do impacto nos preços", defendendo que, além da queda na taxa de juros e impulso ao investimento público, o governo aponte para o setor privado um caminho seguro a seguir.
Por isso, Messenberg avalia que o governo não irá permitir uma desvalorização abrupta do real, o que aumenta a importância de outras medidas que reduzam custos e alavanquem os investimentos. "A redução da taxa básica de juros (Selic) já está reduzindo o custo das empresas e, consequentemente, o peso desses preços na inflação", disse, acrescentando que, além de baixar juros, são necessárias outras medidas, que melhorem o ambiente para o investimento. "Tais medidas devem partir do setor público, sinalizando para todos os setores ameaçados pela concorrência externa qual a direção a seguir".
Derrocada
Até o Plano Real, um dos segmentos econômicos mais pujantes do Brasil era o de peças automotivas. O país era exportador de autopeças e a Metal Leve possuía fábricas nos Estados Unidos. Os problemas causados pela paridade real-dólar na fase inicial do Plano Real não excluem o fato de que, já no governo Lula, o saldo da balança de autopeças saísse do azul (US$ 607 milhões) para o déficit de US$ 4,6 bilhões registrados em 2011.
Segundo o professor Geraldo Augusto Pinto, do Centro de Educação e Letras da Universidade Estadual do Oeste do Paraná, o setor de autopeças já foi indutor de qualificação da mão-de-obra no país. Em sua tese de doutorado, ele ressalta que, no entanto, a partir da década 80, mas, "sobretudo, na década de 90", a cadeia automotiva brasileira entrou num processo de reestruturação produtiva.
"Uma das conseqüências desses processos foi uma severa desnacionalização de grandes empresas de capital brasileiro, acompanhada por elevação do desemprego e de significativas mudanças nas condições de trabalho, as quais, por sua vez, implicaram novas qualificações profissionais e educacionais", diz Pinto.
Além da paridade cambial, a abertura comercial ajudou a acelerar tais transformações. Ele acrescenta: "Ao passo que as montadoras davam passos largos, em muito amparadas pela abertura econômica, os fornecedores de autopeças, por seu turno, em especial os fabricantes brasileiros, sofriam severos impactos, pois se a importação de veículos tendia a diminuir a sua produção no país e, com isso, baixar a demanda das autopeças, por outro lado, a própria importação possibilitou às montadoras diminuir sua aquisição de componentes nacionais."
O setor de autopeças brasileiro foi, então, submetido a uma avalanche de importações, cerca de 383,5% a mais somente entre 1989-1996. Com isso, muitas empresas não se mantiveram no mercado e a falta de resultados das demais induziu à redução de investimentos, prejudicando a geração de empregos em nível nacional.
"As autopeças são mais intensivas em trabalho do que as montadoras", explica Pinto, acrescentando que as aquisições da Metal Leve, da Cofap e da Freios Varga são emblemáticas deste processo.
"Apesar de grandes para os padrões nacionais e concentrando os maiores faturamentos do setor, tornaram-se cada vez menores com relação aos padrões de uma cadeia produtiva crescentemente internacionalizada, fato que se acentuou na prolongada recessão dos anos 80 e na crise do início da década de 90", acrescenta o pesquisador.
Acomodação
O quadro de decadência da indústria manufatureira não se restringe ao setor de autopeças, destaca o vice-presidente da AEB. José Augusto de Castro. Ele destaca o estudo Radiografia do Comércio Exterior Brasileiro: Passado, Presente e Futuro, da AEB, no qual fica evidente que a disparada dos preços das commodities, já no período Lula, ajudou a levar o Brasil à uma "acomodação" com a reprimarização da pauta de exportações.
"No início de 1999, o Brasil adotou o sistema de câmbio livre, que passou a flutuar conforme as forças do mercado. E, como primeiro impacto, ocorreu a desvalorização do real, provocando a elevação do câmbio. Como resultado dessa mudança, o sistema cambial foi adequado até 2006, mantendo a competitividade das exportações, sob o aspecto preço", destaca Castro, acrescentando que, embora o processo de valorização do real tenha começado em 2003, somente a partir de 2007, os primeiros sinais de problemas nas exportações começaram a aparecer, "perdurando até os dias atuais, e agravando-se a cada dia que passa", sublinha.
"Como o valor da taxa de câmbio atual encontra-se ao redor de R$1,80, constata-se que a defasagem cambial não representa simples capricho, pois provoca efetiva perda de competitividade de produtos brasileiros nos mercados externo e doméstico", prossegue o vice da AEB, acrescentando que o câmbio nominal que vigorou no segundo semestre de 2010 e no primeiro semestre de 2011 era mais valorização que o praticado em 1999.
"Projetando-se, hipoteticamente, o repasse de apenas 60% do menor custo inflacionário de 139% do período de 1999 a 2011, correspondente a 83%, e aplicando esse índice sobre a taxa cambial de R$ 1,2079 vigente em 31 de dezembro de 1998, a taxa de câmbio que deveria estar vigorando hoje seria de R$ 2,21, apenas e tão somente para manter patamar equivalente à taxa cambial vigente em 31 de dezembro de 1998, que à época era considerada defasada".
Bomba de efeito retardado
Assim, o governo hoje busca apoiar diversos setores com a competitividade ameaçada, como a indústria de plásticos, também fornecedora do setor automobilístico. Segundo a Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast), o déficit externo do setor cresceu 37,99%, em 2011, de US$ 1,35 bilhão para US$ 1,87 bilhão. Houve queda também na produção (1,5%) na produção, já que as exportações cresceram 2,63%, de US$ 1,47 bilhão para US$ 1,51 bilhão, enquanto as importações aumentaram 19,58%, de US$ 2,83 bilhões para US$ 3,38 bilhões.
"A bomba que está estourando agora, atingindo primeiramente a manufatura, resulta de termos insistido muito tempo na combinação explosiva de câmbio livre com a maior taxa de juros do mundo. Por isso, o real teve valorização de 74,6% de junho de 2004 a dezembro de 2011, sem que tivéssemos a mínima possibilidade de melhorar a nossa produtividade, devido ao brutal aumento de custos", ressalta o presidente da Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast), José Ricardo Roriz Coelho.

 
Contra cortes, C&T recorre a apoio de Petrobras e Coppe
Monitor Mercantil, 16/03/2012
 
Ministro destaca, porém, que países-líderes não reduzem verbas do setor
Diante do corte de 22% do orçamento imposto a sua pasta pela política de desviar recursos da economia para gastar com juros (superávit primário), que retirou R$ 1,48 bilhão dos R$ 6,7 bilhões iniciais, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação vai recorrer a parcerias com a Petrobras, e com a Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ).
A informação foi dada pelo ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Marco Antonio Raupp. Raupp admitiu que a pasta terá contornar "as dificuldades", provocadas pelos cortes orçamentários determinados pelo governo, recorrendo a parcerias com instituições ligadas ao setor e priorizando projetos.
As afirmações foram feitas por ele, após participar da aula inaugural da Coppe/UFRJ: "O ministério pretende distribuir os cortes de maneira que a gente sofra menos, escolhendo projetos prioritários e não cortando neles. Em segundo lugar, fazendo parcerias com Petrobras e Coppe, que teve autorização para financiar o Projeto Ciência sem Fronteiras" afirmou, ressaltando, porém, que o ideal seria não sofrer cortes de recursos.
"Conseguindo parcerias a gente vai superando essas dificuldades, mas evidentemente temos de trabalhar sempre para não ter cortes", acrescentou.
Em sua palestra, ele destacou que países com tradição em C&T, como Estados Unidos, Europa e Japão, mesmo em crise, "têm apostado decididamente nos investimentos em ciência, tecnologia e inovação", estimulando a busca do conhecimento.
Para ele, essa é "uma marca de países que têm tido sucesso e querem continuar a exercer papel de liderança no mundo". Não abandonam jamais nenhum desses dois lados da moeda. É uma lição que a gente tem que tirar."

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