segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Os antecedentes da Teoria do Desenvolvimento no próprio Marx

(Teoria do Desenvolvimento e o Marxismo - 3ª parte)

por Almir Cezar Filho

O tema do desenvolvimento econômico não foi explicitamente tratado pelos fundadores do Marxismo. A questão do desenvolvimento econômico e vários aspectos da dinâmica capitalista, especialmente quanto ao longo prazo e a sua dimensão mundial, não puderam ser desenvolvidas completamente por Karl Marx e Fridriech Engels - embora constasse no escopo do plano de redação dO Capital de Marx. O que abriu uma lacuna para um longo e agudo debate sobre a concepção marxista sobre o fenômeno do desenvolvimento do capitalismo mundial. Contudo, suas obras contêm elementos para entender o desenvolvimento do capitalismo e a dinâmica de longo prazo, como também servem de ponto de partida. Portanto, os antecedentes da teoria do desenvolvimento estão nas próprias obras de Marx e Engels.

No prefácio da Contribuição à Crítica da Economia Política (1857), de Marx, onde apresenta o que deve ser o método da Economia Política; ele afirmou que a base de toda análise materialista da história e da economia deve partir das relações de produção que se estabelecem no interior de uma dada população, da organização social que decorre do modo de produção, isto é, da população dividida em classes sociais da maneira como ela trabalha e de como se faz a divisão social do trabalho; em seguida, da maneira como circulam e são trocados os produtos deste trabalho na sociedade e no mercado mundial; enfim das formas que toma o Estado e da maneira como ele influência a produção deve-se partir dos mecanismos reguladores desta economia para se explicar o papel e a função de suas relações externas e da influência dos fatores externas.

Fragmentos em sua obra, expostos a seguir, mostram rudimentos sobre o tema do desenvolvimento econômico-social sob o capitalismo, abordado por Karl Marx. No Prefácio da 1ª edição dO Capital, ele escreve: “O segundo volume desta obra tratará do processo de circulação do capital (livro II) e das formas concretas do processo de produção capitalista considerado globalmente (livro III), e o volume terceiro e último (livro IV), da história da teoria. (Londres, 25 de julho de 1867).” No Prefácio está preparando os leitores para o que viria ser uma coleção que constituiria ser O Capital

Como se pode ver as categorias relacionados aos temas do desenvolvimento econômico-social estariam sendo tratados no livro III, que contudo será editado por Engels, apenas a partir de esboços inacabados de Marx.  Embora o livro III possa ser considerado em muitos sentidos o ápice da obra - tendo em visto que está contido, por exemplo, a famosa apresentação do problema da queda tendencial da taxa de lucro e toda a discussão sobre capital financeiro - é também um texto muito delicado porque não chegou a ser finalizado em vida pelo autor. O livro III aborda as relações concretas – lucro e crise, crédito e capital acionário – que determinam o cotidiano capitalista.

Antes de começar a explica de maneira abstrata a natureza e gênese do capital, ele afirma que a sociedade é um ser mutável. “A sociedade atual não é um ser petrificado, mas um organismo capaz de mudar, constantemente submetido a processo de transformação”. 

Ao pesquisador social importa investigar na verdade é esse movimento de transformação. Esse movimento é feito pelos próprios antagonismos e contradições internas que existem na sociedade. Portanto, o central é justamente investigar as contradições.
“Intrinsecamente, a questão que se debate aqui não é o maior ou menor grau de desenvolvimento dos antagonismos sociais oriundos das leis naturais da produção capitalistas, mas estas leis naturais, estas tendências que operam e se impõem com férrea necessidade. O país mais desenvolvido não faz mais do que representar a imagem futura do menos desenvolvido.”
“Uma nação deve e pode aprender de outra. Ainda quando uma sociedade tenha desvendado o significado da lei natural que rege seu movimento – e o objetivo final desta obra é descobrir a lei econômica do movimento da sociedade moderna – não pode ela suprimir, por saltos ou por decreto, as fases naturais de seu desenvolvimento. Mas, ela pode encurtar e reduzir as dores do parto.”
Anos antes, Marx pretendia trabalhar de um forma diferente. Planejava seu tratamento sobre o capitalismo na forma em dividir a Economia Política em seis grandes temas, iniciando pelo “capital”, que inclusive seria seu primeiro livro. No “Prefácio” do Para a crítica da Economia Política, ele diz, “Considero o sistema da economia burguesa nesta ordem: capital, propriedade fundiária, trabalho assalariado; Estado, comércio exterior, mercado mundial.” Posteriormente, para Marx, o tema "capital", absorveria todos os demais, razão para que seu livro tenha sido intitulado de O Capital.

Como se vê, Marx pretendia trabalhar de uma forma diferente do se seguiu, mas esse plano de estudo dá uma forte pista das bases e objetivos que acabaram incompletos, e são fortes alicerces para se prosseguir na questão e na forma de tratá-la.

Como se pode ver na “Introdução” do “Para Crítica da Economia Política”, apresenta todos os temas que serão tratados em sua investigação. Marx expõe da seguinte forma:
“As seções adotar devem evidentemente ser as seguintes: 1- as determinações abstratas gerais, que convêm, portanto mais ou menos a todas as formas de sociedade, mas consideradas no sentido acima discutido; 2- as categorias que constituem a articulação interna da sociedade burguesa e sobre as quais assentam as classes fundamentais. Capital, trabalho assalariado, propriedade fundiária. Os seus relacionamentos recíprocos. Cidade e campo. As três grandes classes sociais. A troca entre estas. A circulação. O sistema de crédito (privado); 3- síntese da sociedade burguesa na forma do Estado. Considerado no seu relacionamento consigo próprio. As classes “improdutivas”. Os impostos. A dívida pública. O crédito público. A população. As colônias. A imigração; 4- relações internacionais de produção. A divisão internacional do trabalho. A troca internacional. A exportação e a importação. A cotação do câmbio; 5- o mercado mundial e as crises.”
Vendo retrospectivamente O Capital vê-se, portanto, que os temas ligados tipicamente ao fenômeno do desenvolvimento foram pouco trabalhados por Marx, sendo eles os que constariam no item 3 e principalmente no 4 e 5.

E ainda, em base a citação acima de “Para Crítica da Economia Política”, vê-se que, ao contrário de que o Marxismo convencional estabeleceu (ou assim interpretou), uma legítima teoria marxista do desenvolvimento econômico não pode ser confundida com a Teoria do Imperialismo; essa é mais para Economia Internacional, isto é, ciência e estudo das relações internacionais, econômicas e interestados nacionais sob a vigência do Capitalismo em sua forma Monopolista. 

O Desenvolvimento Econômico é assim, tanto um “movimento” econômico histórico de longo período do Capitalismo, como uma "caminhada" de uma etapa histórica a outra. E à medida que a economia vão se movimento em seu curso, vai engendrando modificações em si, que se alastrando para várias esferas da vida social. Por sua vez, a economia, suas estruturas, sua dinâmica, suas relações, não poderiam passar incólume por uma profunda transformação na ordem jurídica e política, produto de uma revolução, mesmo que não a triunfe como socialista.

Assim, numa perspectiva marxiana, uma Economia do Desenvolvimento marxista, obrigatoriamente implica em ter, ou acabar sendo, uma “Economia da Revolução”, retomando inclusive o conceito original de revolução, como mudança e movimento de longo curso, como também de transformação abrupta e radical da vida social, não apenas como um "tumulto", ruptura. Não à toa que, a presente série de escritos que vocês podem ler a seguir se chama A Economia e a Revolução.


Referências bibliográficas:
  • Contribuição à Crítica da Economia Política
  • Para a crítica da Economia Política
  • O Capital
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