sábado, 17 de março de 2012

Morre o geógrafo Aziz Ab'Saber. Leia uma das suas últimas entrevistas

Um dos maiores intelectuais do país, Ab'Saber faleceu aos 87 anos na manhã desta sexta-feira (16). Nos últimos anos foi um dos intelectuais brasileiros que mais lutaram contra as alterações no Código Florestal.

Releia entrevista que foi capa da revista Fórum
Por Redação [16.03.2012 15h00]

O geógrafo Aziz Ab'Saber faleceu aos 87 anos na manhã desta sexta-feira (16), em decorrência de um infarto sofrido em sua casa, na cidade de Cotia (SP).

Nascido em outubro de 1924 na cidade de São Luiz do Paraitinga (SP), era um dos intelectuais mais renomados do país, sendo autor de diversos estudos e teorias fundamentais na área da geografia física e
referência em temas como aspectos naturais do Brasil e meio ambiente.

O geógrafo foi capa da edição 52 de Fórum, de julho de 2007. Releia abaixo a entrevista na qual o Aziz Ab'Saber falou sobre mudanças climáticas e promoção de políticas públicas na área do meio ambiente.

Uma voz contra a corrente
Um dos maiores intelectuais do Brasil, o geógrafo Aziz Ab Saber confronta as conclusões sobre mudanças climáticas feitas pelo IPPC e critica a postura do governo federal na área do meio ambiente.
Por Anselmo Massad, Glauco Faria  e Mouzar Benedito

Prestes a completar 83 anos, o geógrafo Aziz Ab'Saber exibe em seu discurso uma vitalidade invejável. Um dos maiores estudiosos de sua área no planeta, sua capacidade de análise o deixa bastante à vontade para, por exemplo, confrontar especialistas como os que fazem parte do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC). "Não sabem nada, são pessoas da Física, engenheiros e outros. Não dá para confiar
neles", ataca.


Na entrevista abaixo, concedida em sua sala no Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (IEA/USP), o professor falou sobre meio ambiente, as soluções hídrícas para o sertão nordestino, e
não poupou o presidente da República. "O Lula é um grande esperto.  Para poder se reeleger, fez várias reuniões com intelectuais. Uma no Rio de Janeiro foi uma coisa séria, trouxe todos os intelectuais em um restaurante muito rico, todos favoráveis. Depois, 'até logo'". Confira um trecho do publicado na revista. A íntegra está na edição em bancas.

Fórum - Muito se discute hoje que, para frear o processo de
aquecimento global, a única alternativa que de fato resolveria seria
optar por uma mudança de matriz energética. Nesse caso, pelas
condições do país, a escolha seria a energia hidrelétrica mesmo?

Aziz Ab' Saber - A mais limpa e saudável alternativa é a energia
hidrelétrica, mas estamos em um dilema. Ou fazemos essas usinas, ou
caminhamos de novo para a energia nuclear, como outros países do mundo
vão ser obrigados a fazer. Nem todo país tem os recursos hídricos que
o Brasil tem. Aqui, são 78% de drenagens abertas para o mar e perenes.
Nossa situação de usar primeiramente as barragens para geração
elétrica é favorável do ponto de vista ambiental. Mas, do ponto de
vista biológico, no caso da ictiofauna fluvial, vamos ter problemas,
mas não dá para resolver tudo. Os ambientalistas que lutam contra
essas usinas não estão fazendo o balanço das vantagens da usina. Há
desvantagens, mas não é com isso que eles trabalham, e sim com as
dificuldades de preservação da fauna fluvial no trecho a montante da
barragem.

Fórum - Outro problema para a população ocorre quando não retiram a
madeira. Em Tucuruí, por exemplo, aconteceu isso...

Ab'Saber - Mas são obrigados. São obrigados. No projeto, se não houver
a remoção lateral da madeira vai ser um problema infernal que você não
pode imaginar. É preciso ter ido a um lugar como esse para saber o que
é o mau cheiro. Se vai realmente construir a usina, tem que deixar um
espaço limpo na floresta. Aí entra outra questão: a área desmatada é
muito grande, não é simples. Além disso, é uma área que tem ainda
alguns agrupamentos indígenas pequenos, mas extremamente bravios em
termos de uso de seu espaço florestal por atividades inundadoras.

Mas ao observar o rio Madeira, entre os confins das terras
ligeiramente mais acidentados e os grandes tabuleiros florestados, não
é muito fácil encontrar lugares para fazer barragens com certeza de
que vai haver sucesso. As empreiteiras não querem saber disso, já há
algum tempo pensam fazer dinheiro com essas obras. E o governo faz de
conta que não há problemas. É complicado, não sigo diretamente a
linhagem de argumentação dos ambientalistas rígidos, que se fixam um
pouco demais na piracema do Madeira. Sabe-se que o rio está muito
poluído por causa da exploração de ouro e o uso de uma série de
produtos químicos perigosos. O rio já tem problemas, e a barragem vai
se somar a eles. E, ao mesmo tempo, há outros processos que não serão
atendidos no projeto de construção, como a questão da distância. A
usina do Madeira fica muito longe do Centro-Sul do país, o que
exigiria obras grandes de transmissão, muito custosas. Acontece que o
governo sempre quer fazer obras gigantescas, faraônicas. Quer transpor
as águas do São Francisco, fazer barragens no Madeira, que nem conhece
direito, nem sabe a distância, tem pouco conhecimento geográfico.

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