domingo, 17 de maio de 2020

A Utilidade do Estudo Teórico da Economia Soviética, por Evgene Preobrazhensky


Artigo publicado no periódico Bolchevik, nº 15-16 (31 de agosto de 1926). Foi uma resposta as críticas levantadas ao seu livro A Nova Econômica, do mesmo ano, onde analisa, segundo a Economia Política marxista, a dinâmica e o desenvolvimento da economia soviética.

Os capítulos publicados de meu livro A Nova Econômica, consagrado à análise teórica da economia soviética, têm sido objeto de acerbadas críticas. Meus oponentes se têm lançado principalmente sobre o capítulo que trata da lei da acumulação socialista. O capítulo sobre a lei do valor na economia soviética tem recebido, em princípio, uma acolhida muito mais favorável durante os debates que tiveram lugar na Academia Comunista. Alguns críticos chegaram inclusive a felicitar ao autor. Mas, no artigo do camarada E. Goldenberg, publicado no número de 30 de abril de Bolchevik, o novo capítulo é criticado com tanta dureza como o anterior. Ignoro se as críticas são meramente a opinião do camarada Goldenberg; parte de os críticos manifestam em miúdos uma virulência superior ao normal; em todo caso, se as restantes críticas de meu artigo são mais objetivas ela será um bem para todos. No que me concerne, quero proceder com calma e objetividade. Existe uma divergência: por que querer exasperá-la a posteriori ou inventar fatores acessórios a mesma? Os que adotam esta atitude, tanto no plano teórico como no prático, não pensam em nosso futuro, e por ela se concedem o luxo de uma discussão estéril.

A validez ou, ao contrário, a inutilidade de uma elaboração teórica no campo da ciência social tal como a praticamos nós, marxistas-leninistas, está determinada essencialmente por sua concordância lógica com os princípios metodológicos e os fundamentos essenciais do marxismo e do leninismo; o está, ademais, pela medida em que permite formular previsões exatas no campo dos fenômenos sociais e econômicos, e sirva diretamente aos objetivos práticos de nossa classe. Esta verificação do método é decisiva, porque o marxismo e o leninismo constituem já uma verificação lógica previa a toda nova elaboração e o são na medida em que eles mesmos têm sido verificados a partir da experiência das lutas concretas da classe operária. Quando se inicia uma discussão para saber se tal elaboração concorda ou não desde o ponto de vista lógico com o marxismo e o leninismo, o discurso puramente lógico pode prosseguir-se indefinidamente. Mas o único autenticamente decisivo e irrefutável é a prática.



Desde o ponto de vista da verificação lógica – e prática, cada vez, que ela seja possível – de minha teoria da economia soviética, proponho-me examinar agora as principais objeções formuladas pelo camarada Goldenberg e por outros críticos contra as teses fundamenteais de meu escrito. Tratarei por conseguinte de demonstrar que meus críticos mantêm suas atuais posturas – que semelha à teoria econômica marxista-leninista, com todas as conseqüências práticas que dele se depreendem.
Começarei pelo problema metodológico.

O camarada Goldenberg me acusa de “um modo vulgarmente mecanicista de defender o problema” na medida no que recolho “a relação dialética entre os princípios contraditórios e opostos”, e que me dedico a “exercícios escolásticos e definições de lógica formal”, etc. Mas como demonstra?

Primeira demonstração, afrontando a análise do modo através do qual se manifestam as categorias capitalistas em nossa economia subtraia concretamente os elementos da economia socialista planificada que se opõem a estas categorias. O camarada Goldenberg pretende não compreender o significado metodológico desta exposição e de seu papel, tais como se deduz de minha exposição. Em sua opinião, “esta pura oposição (...) mostra claramente a incompreensão total do camarada Preobrazhensky sobre o papel efetivo da lei do valor em nossa economia (...); finalmente, o socialismo – é evidente – leva à eliminação total do mercado e das relações entre mercados. Não há erro mais grosseiro e perigoso que confundir o resultado do processo com o próprio processo.

Tenho que formular, sobre este ponto, alguns observações, não tanto para o camarada Goldenberg, quem seguramente sabe muito bem de o que falo, e que se encontra muito absorvido pela seu trabalho de refutação, senão para os leitores que poderiam tomar em sério sua “argumentação”.
    1- Uma análise autenticamente científica do sistema econômico de transição mercantil-socialista é inconcebível se há abstração do fim para o qual se dirige esta formação econômica.
    2- Unicamente tendo em conta continuamente os dois pólos de todo o processo (o pólo inicial e o pólo final) podemos compreender a localização histórica de qualquer forma de transição, evitando deste modo perdemos nos detalhes ou cair na economia vulgar que tenta colar a descrição superficial do presente como uma análise científica de um sistema econômico concreto.
    3- A oposição em questão se encontra na base da obra de Marx, de Engels e de Lênin. Sem uma oposição de princípio entre capitalismo e socialismo, uma autêntica análise do capitalismo propriamente dito é inconcebível. O leitor poderá encontrar a prova dele em O Capital, o Anti-Dühring, a correspondência entre Marx e Engels, etc. Lênin unicamente pode edificar a teoria do capitalismo monopolista opondo o socialismo ao capitalismo.
    4- Marx fundou seu estudo do capitalismo sobre a análise de um capitalismo abstrato; é dizer, segundo Goldenberg, confundindo os resultados do processo com o próprio processo; e, por esta razão, como todo o mundo sabe, tive que sofrer os violentos ataques de toda a internacional dos economistas vulgares e pequeno-burgueses.
    5- A oposição fundamental ente capitalismo e socialismo se impõem igualmente como método de análise em qualquer fase do desenvolvimento da forma econômica mercantil-socialista. Tendo em conta que todo o processo de marcha para o socialismo é um processo de luta entre duas formas de economia, não podemos compreender nem a importância dos blocos enfrentados, nem o desenvolvimento particular da luta em seus resultados diretos, se não temos sempre presente em nosso espírito a direção para a qual se orientam a transformação e o desenvolvimento da economia de transição. Esquecê-lo seria igualmente – ao nível teórico – cair nas posições de Bernstein, e admitir a conhecida tese: “O movimento é tudo; o fim, nada.”
    6- O absurdo da postura do camarada Goldenberg é muito evidente para que nos detenhamos por mais tempo nela. Mas não é casual que o camarada Goldenberg e uma parte de quem me criticam se tenham irritado pela oposição entre socialismo e capitalismo na análise de uma certa fase da economia de transição. Contudo, saber aplicar esta oposição na análise concreta de um momento dado do desenvolvimento do sistema mercantil-socialista mostra que se saber afrontar a análise da luta entre os dois princípios no seio da nossa economia, mostra igualmente que se buscam as leis que regem esta luta, e que se leva – deliberadamente ou não -, através da análise do desenvolvimento da economia de Estado, à lei da acumulação socialista primitiva. Mas esta perspectiva não parece agradar a meus contraditores. Por esta razão se vem obrigados, por uma parte, a repetir – trocando unicamente a forma e as palavras – a mesma frase sobre a luta de princípio de planificação contra o princípio de mercado, e, por outra, a apresentar como “análise” de nossa economia uma bagunça composta por certos termos marxistas e uma descrição da economia política do Estado em cada momento concreto. Se trata de uma atitude de mecanicismo teórico que não é outra coisa que a expressão ideológica e a justificação do mecanicismo no campo da atividade prática.

Basta com ler o artigo do camarada Goldenberg para dar-se conta de que se limita a oferecer ao leitor, em lugar de uma “análise” da economia soviética, uma contínua repetição dos mesmos conceitos, acompanhada de ataques polêmicos contra minha pessoa, utilizando frequentemente minhas próprias ideias. Vede como nos tem enriquecido a leitura do artigo! Antes de ler ao camarada Goldenberg não havíamos dado conta de que “o desenvolvimento do nível mercantil da economia camponesa constituí o começo (...) de sua ligação com a indústria socialista”, que “o desenvolvimento do princípio de planificação pressupõe o domínio das relações de mercado”, que o processo de acumulação não só se realiza graças aos excedentes do campo, senão que também se realiza no seio da própria indústria. É toda uma corrente de ideias profundas e novas o que o camarada Goldenberg lança sobre mim, em seu polêmico artigo.

Porém o leitor se figura que para ir de Moscou a Leningrado temos passado por Tver, ali se encontra o camarada Goldenberg para demonstrar que para ir de Moscou a Leningrado é absolutamente indispensável atravessar a vila de Klin.

O camarada Goldenberg tem razão: é necessário passar por Klin e já temos passado, e, agora, o quê? Como podemos enriquecer nossos conhecimentos para o futuro? (P. 273)

Só lhe pedimos uma coisa: quando chegamos a Leningrado que não nos martirize gritando-nos que para chegar a Leningrado é necessário passar, sem lugar a dúvidas, por Tver, e, ademais, atravessar o Volga, que desemboca no mar Cáspio.

O camarada Goldenberg me acusa de não dizer nada das “transformações das relações mercantis em relações socialistas, e de falar, unicamente da eliminação de uma forma sem consideração da outra”. Esta acusação unicamente parecerá justificada na medida em que partes dos leitores do Bolchevik não tinham lido aqueles escritos meus que o camarada Goldenberg pretende “derrubar”. Tanto no opúsculo Da NEP ao Socialismo como nos dois capítulos de minha obra sobre a teoria da economia, assim como em meu livro A Nova Econômica, tem-me referido numerosas vezes não ao tema da eliminação de certas formas por outras, senão também a da subordinação e transformação das formas historicamente retrograda, baixo a ação dinâmica do setor econômico socialista. Por tanto, a objeção do camarada Goldenberg não é exata desde um ponto de vista formal. Tem, por outra parte, e igual que suas restantes indicações, uma significação lógica e social. O camarada Goldenberg ousa afirmar que, em minhas análises, tem “divido a economia do país em duas metades, uma das quais está dominada pela planificação e a outra pela espontaneidade”... Mas eu não tenho dito nunca que a planificação predominava já totalmente na economia do Estado: há inclusive nesse setor mais espontaneidade que a que seria necessária. O que afirmo é o ponto de partida econômica para um plano, para a aplicação do princípio socialista, para o desenvolvimento da produção socialista ampliada; em outras palavras, que o princípio da manifestação da lei da acumulação socialista primitiva está constituída por nossa economia de Estado, em luta contra a economia privada, sem ter em conta as formas particulares desta luta.

A coexistência com a economia privada não excluí, em princípio, a luta. De mesmo modo que a coexistência do Estado soviético com os países capitalistas é unicamente uma expressão diferente da luta de classes entre o proletariado e a sociedade burguesa. Deve aparecer como algo absolutamente evidente que a transformação das formas econômicas inferiores em formas superiores, por exemplo, a criação de cooperativas agrícolas através do apoio da indústria de Estado, é o produto da luta da sociedade socialista contra a economia de tipo medieval do campo. A coexistência destas duas formas econômicas em nossa economia cria uma espécie de unidade do sistema em sua totalidade, mas o equilíbrio do sistema só poderia ser alterado por uma luta frontal. A luta do princípio socialista com a economia privada se transporta ao exterior, na medida em que não se afloram os laços que mantemos com a economia mundial, senão que, pelo contrário, tendem a estreitar-se. Esta luta passa ao interior, na medida em que a ligação (que se verifica através do mercado) entre economia de Estado e economia privada não desaparece, senão que, pelo contrário, se reforça. Esta luta compreende uma ampla gama de relações: eliminação pura e simples de certas formas, subordinação de umas a outras, transformação de formas inferiores em formas superiores. Tudo isto é o resultado de uma luta, não de uma “renovação pacífica”. Se recusa-se “dividi-lo em duas metades” ao nível da análise teórica ( o que não tem sido bem aceito pelo camarada Goldenberg), não é possível nenhum análise científica de nossa sistema, e ao contrário. Deixar em silêncio os elementos de luta entre estas duas formas econômicas, se não é o fruto de um erro, é ao menos o resultado de uma análise muito superficial dos fenômenos econômicos e sociais do sistema soviético; análise que, se pode prever facilmente, tem o risco de reservamos as mais amargas desilusões; no caso pior, poderia repetir a teoria de Bernstein sobre a atenuação das contradições sociais, econômicas e de classe. Esta concepção não atenua em si as contradições aparecidas historicamente em nosso sistema em proveito da ditadura do proletariado, mas desorienta à classe operária dirigente e a seu partido, ao qual incumbe elaborar uma análise exata da sociedade na que deve levar a cabo sua missão histórica.

É necessário que observemos que existe, em geral, entre nós, uma singular confusão de idéias a este respeito, e ela não é culpa do camarada Goldenberg. A análise de nosso sistema – em tanto que formação social avançada através do desenvolvimento antagonista das contradições e da luta entre a lei da acumulação primitiva e a lei do valor – se confunde escandalosamente com o problema de saber se a atenuação das contradições entre as classes é, ou não, vantajoso para nós. Em quanto se refere à primeira contradição, uma análise marxista científico se preocupará por deduzir o que dele aparece nos fatos. Atacar minhas teses porque irrita à pequena burguesia nacional equivale a capitular ante ela, e submeter a vida intelectual do partido, assim como a formação de novos quadros, a uma censura moral prévia.

O problema da atenuação das contradições no nosso país unicamente pode ser defendida corretamente do modo seguinte: para nós, classe operária dirigente, é vantajoso atenuar todas as contradições que podem manifestar-se em contra nossa, e sacarmos vantagens do reforçamento desta contradições cada vez que este processo está dirigido contra o capitalismo. A fórmula do bloco operário-camponês é em primeiro lugar a fórmula da associação dos interesses de operários e camponeses contra a burguesia; esta fórmula, por outra parte, representa a atenuação das contradições entre estas duas classes, sempre a favor da luta contra a burguesia.

A atenuação das contradições sobre esta base se realiza essencialmente e ante todo, atualmente, por meio da industrialização do país, desenvolvendo a agricultura, resolvendo os problemas da força de trabalho excedentário no campo, facilitando créditos a longo prazo (o que não pode fazer uma indústria débil), promovendo a colaboração produtiva dos camponeses pobres. Este processo supõe igualmente que se criem as condições de uma melhor organização da economia do país ao redor da economia do Estado, que se favoreça uma melhor coordenação da periferia pequeno-burguesa com os centros dirigentes de nossa economia, e que se tente levar o nível econômico do campo ao da cidade. Desde o ponto de vista sociológico, se trata de um reforçamento geral da sociedade soviética. De uma coesão interna maior, e de uma superior capacidade de resistência às pressões exteriores; isto significa, finalmente, a transformação do frágil patriotismo pequeno-burguês dos camponeses (sempre precário e em casos de guerra exterior), em patriotismo socialista de país industrializado e de ditadura do proletariado.

Este processo – essencial para nossa classe, para o sistema soviético, para o socialismo, e para os elementos dinâmicos e de progresso no campo – constitui ao mesmo tempo um processo agitado, longo, perigoso; tanto mais perigoso quanto mais se prolongue, porque nosso principal inimigo está disposto a interrompê-lo à primeira ocasião.

Por outra parte, a pressão que a lei do valor do capitalismo mundial exerce sobre nossa economia (que segue sendo débil, ainda que estejamos unidos ao oceano do mercado mundial pelo estreito do atual mecanismo do comércio exterior), é uma pressão que está destinada a crescer. Deste modo, o problema do ritmo da industrialização se transforma não somente em problema de equilíbrio econômico e de política interior, senão também em problema particular de sobrevivência frente a nosso inimigo principal.

Contudo, tendo em conta o exíguo do capital estrangeiro em forma de créditos a longo prazo, o problema da industrialização se enfrenta ao da utilização dos recursos interiores para o divisão o mais equilibrado possível das forças produtivas entre a cidade e o campo. Tem aqui o autêntico problema da acumulação primitiva socialista, com suas exigências de proporcionalidade na produção socialista ampliada, imposta por uma pressão exterior. Tem aqui a lei da acumulação primitiva socialista que não tem sido inventada por Preobrazhensky em seu ardor polêmico, senão que deriva objetivamente das condições da luta contra o mundo capitalista em que se encontra nossa economia de estado traz a revolução de Outubro. Esta lei nos obriga a respeitar certas proporções na obtenção do sobreproduto do campo com vistas à produção socialista ampliada. Criticando este modo de apresentar o problema, meus oponentes não lutam tanto contra mim em particular, ou contra nossos industriais, senão que protestam de fato contra as condições objetivas pelas que atravessa a construção do socialismo em um só país, agrícola por acréscimo. Seus ataques não são mais que o reflexo ideológico e político das tendências que nosso desenvolvimento econômico tem superado já como em outra ocasião demonstrarei. Os próprios fatos refutarão a opinião de que são meus oponentes quem defendem uma política mais prudente, mais adaptada a nossa situação, mais capacitada para defender o bloco formado pelos operários e a maioria dos camponeses.

Enquanto que, nas condições de escassez de mercadorias e de acumulação socialista insuficiente em que nos encontramos, os camponeses entregam cada ano ao capital privado ou às cooperativas centenas de milhões pela diferença entre os preços ao por maior e ao menor, estes camponeses possuem excedentes monetários inutilizados, e seu grão não se vende (são os ratos os que se o comem). Estes centenas de milhões de acumulação campesina são certamente capazes de provocar uma insatisfação. Mas, ao mesmo tempo, uma política deste tipo propõe as premissas que apagam esta insatisfação, através do aumento da produção, a integração de novos trabalhadores do campo, uma maior afluência de produtos no mercado e mediante uma diminuição da exploração à que estão submetidos os camponeses por parte do capital comercial. Pelo contrário, uma política de subacumulação sistemática, uma política de carência de produto e, por conseguinte, de incremento dos preços ao por menor, uma política como esta faz crescer pouco a pouco a insatisfação camponesa, ao tempo que a pressão do campo sobre nosso sistema de protecionismo e de monopólio do comércio exterior pode ter muitas graves consequências para a edificação do socialismo em nosso país. Esta política constitui uma concessão de cara ao atraso econômico e só em aparência é acertada: em certa etapa do desenvolvimento de nossa economia, se troca exatamente em seu contrário.

O camarada Goldenberg trata de degrau o problema do intercâmbio não equivalente entre indústria socialista e pequena produção e, criticando meu modo de propor o problema, parece decidir-se pelo intercambio equivalente. É importante que se tenha uma concepção teórica perfeitamente clara sobre este ponto essencial e não se deve evitar o afrontá-lo de um modo direto. Proponho ao camarada Goldenberg, assim como a todos meus contraditores, que expressem explicitamente sua postura exata sobre este problema. Se declaram-se em favor do intercâmbio equivalente – como têm mais ou menos intenção de fazê-lo -, me verá então na obrigação de demonstrar ou bem que são ignorantes em matéria econômica, ou bem que sobre este ponto se afastam do marxismo e se deslizam para posições próprias do populismo pequeno-burguês. Tende finalmente que demonstrar que pretendem impor ao socialismo o benefício da pequena produção.

Até que ponto o camarada Goldenberg desconhece minha posição de fundo sobre o problema da lei da acumulação primitiva socialista – ainda que a exponha e a critique de um modo muito hábil –, é o que se deduz evidentemente desta observação presunçosa que dirige contra mim. Escreve: “Segundo o plano quinqüenal previsto pelo Gosplan, investiremos no curso do próximo quinquênio cinco bilhões de rublos em capital fixo, dos quais quatro mil e quatrocentos milhões proverão da própria indústria; ela significa que o deslocamento  que para o camarada Preobrazhensky é fundamental, essencial, etc – cobrirá pouco mais que uma décima parte da soma global, na qual se encontrará durante o próximo quinquênio, segundo este plano, a parte fundamental da acumulação socialista real”.

Formulando esta observação, que considera certamente como definitiva, o camarada Goldenberg “esquece” dizer a seus leitores com que preços maiores se poderá obter esta acumulação.

“Esqueceu” dizer que todo isto unicamente será realizável mediante preços muito mais elevados que os do mercado mundial: é dizer, transgredindo a lei do valor da economia mundial. O que quer dizer que todo isto se realizará através de uma não-equivalência do intercâmbio entre a grande produção e a pequena, muito mais importante que a que se manifesta na economia mundial (na economia mundial não existe tampouco intercâmbio equivalente entre estes setores, posto que os preços dos produtos agrícolas se estabelecem baixo o princípio da concorrência entre a pequena produção agrícola e a grande e média agricultura capitalista), conservando o monopólio do comércio exterior e o protecionismo socialista, etc, que todo ele se realizará por conseguinte sobre a base da lei da acumulação primitiva socialista. Se se faz atuar à lei mundial do valor e se os preços interiores tem a estrutura correspondente a esta lei, não somente não investimos estes cinco bilhões, senão que pelo contrário dilapidaremos mais da metade de nosso capital fixo.

O leitor se haverá dado, mediante este exemplo, do agradável que é discutir com críticos como o camarada Goldenberg, e até que ponto compreendem realmente o que dizem.

O camarada Goldenberg, que compreende tudo perfeitamente, reconhece não haver compreendido muito bem um ponto de minha exposição, o que não lhe impede caçoar sobre sua incompreensão. Não compreende “por que, em definitivo, o camarada Preobrazhensky afirma que a lei da acumulação primitiva socialista é a forma mediante a qual se manifesta o processo de transformação dialética das leis espontâneas da economia inorganizada em uma nova forma de obtenção do equilíbrio”. Por que dialético? Que pinta aqui a dialética?

Antes de explicar ao leitor o que pinta aqui a dialética, me gostaria fazer a observação de que o camarada Goldenberg, quem me acusa de “propor o problema de um modo vulgarmente mecanicista”, se pretende explicitamente expertise na arte de afrontar dialeticamente a análise de nossa economia. A palavra “dialética” tem conhecido entre nosso uma popularidade incrível. Pessoas que jamais tem lido a Hegel (não falo inclusive de quantos o tem lido sem compreender-lhe) declinam esta palavra em todos seus casos. Repetindo-a sem parar, aproximando aos leitores, lhes fazem se avergonhar de sua ignorância e tomar aos porta-vozes da “dialética” por gentes que conhecem o método de Hegel e de Marx ao dedo.

O camarada Goldenberg deveria saber que empregando os métodos polêmicos que usa comigo se pode “demolir” a análise mais perfeita, mais clássica, inclusive aquele que reproduz cientificamente o processo dialético do desenvolvimento social, mas afastando-se de O Capital de Marx. Dialético quer dizer, em primeiro lugar, unitário. A descrição de um aspecto particular de um processo unitário pode opor-se sempre “com êxito” ao todo, se se abandona o plano da lógica dialética para evolucionar pela esfera do que Hegel denomina “as definições elementais e distintas”.

Ele é tanto mais simples quanto que o movimento dialético é um movimento que se desenvolve sobre a base de uma contradição interna. Temos justamente a nosso alcance um exemplo deste tipo de crítica. Sabendo, devido a minha exposição, que a lei da acumulação primitiva socialista – no que se refere à distribuição dos recursos materiais do país – é a lei da transferência de valores da produção pré-socialista a economia do Estado do proletariado, meu crítico afirma: “Desta concepção da lei fundamental da acumulação socialista deriva logicamente a afirmação de que a lei do valor limita a acumulação”. Meu oponente não julga oportuno compreender que o problema não se limita a este aspecto particular da lei. A lei de acumulação primitiva socialista rivaliza com a lei do valor, não somente na esfera da distribuição do sobreproduto do país, senão em todo o que se refere a regulação da vida econômica, sobre todo o repartição da força de trabalho. Trato sobre este problema ao longo de minha obra A Nova Econômica, e igualmente no capítulo criticado por Goldenberg, “A lei do valor na economia soviética”. A frase citada anteriormente – na qual a expressão “transformação dialética” permanece incompreensível para o camarada Goldenberg -, esta frase se refere à luta da lei da acumulação primitiva socialista contra a lei do valor na esfera global das relações econômicas e também, por tanto, na esfera da luta por uma regulação unitária do sistema econômico. Meus crítico mostra que pertence, neste caso, ao grupo dos porta-vozes da palavra “dialético” que anteriormente assinalamos.

Explicarei agora brevemente e de um modo mais elemental ao camarada Goldenberg, por se ocorre que não tem compreendido certamente minha tese, e sobre todo aos leitores, o que tem querido dizer exatamente na frase incriminada pelo camarada Goldenberg.

Se atualmente, em nosso país, as relações econômicas se formaram baseando-se na livre ação da lei do valor da economia mundial, se produzi-la o seguinte: dados os preços atuais do mercado mundial e a superindustrialização da Europa, os dois terços de nossa grande indústria ficaria eliminados a causa de sua situação deficitária e de seu caráter não necessário, desde o ponto de vista capitalista, desde o ponto de vista da divisão mundial do trabalho sobre a base capitalista. Nossa agricultura, pelo contrário, se ressentiria profundamente, ao longo prazo, pela transformação do país em sua semicolônia agrícola do capitalismo mundial; contudo, durante os primeiros anos, obteria certamente benefícios a causa do nível sensivelmente inferior dos preços industriais e de um intercâmbio mais favorável no mercado mundial. Posto que não existe lei do valor alemão, americano, ou russo, senão unicamente uma lei do valor da economia mundial manifestando-se mediante certas oscilações e variações sobre o território de um país determinado  ou de um grupo de países, uma expansão constante da ação desta lei sobre nosso território debaixo a influência exterior do mercado mundial e graças ao desenvolvimento interior das relações mercantis, uma expansão constante desta lei poderia alterar todo nosso sistema, e neste caso a repartição das forças produtivas se mostraria conforme às exigências da reprodução das relações capitalistas na economia mundial em seu conjunto (e não em benefício do desenvolvimento capitalista-mundial em nosso país, como pretendem os mencheviques, quem, neste campo, demonstram, entre outras coisas, uma total ignorância da economia e um desconhecimento das tendências gerais da economia mundial contemporânea – por exemplo, na luta contra os mencheviques, apenas se utiliza o argumento da destruição do poder soviético; se se verificara a consigna menchevique “ de novo o capitalismo” significaria praticamente a parada de dois terços de nossa classe operária e, ademais, de sua parte mais qualificada - ). A única regulação de nossa economia venderia dado então pela lei do valor.

Que opomos nosso à lei do valor, cuja expansão significaria o aumento das tendências desagregadoras de todo nosso sistema?

Cada leitor poderá observar pessoalmente o que, no nosso país, se opõe à lei do valor: o monopólio do comércio exterior, o protecionismo socialista, um plano rigoroso de importações elaborado em favor da industrialização do país, o intercâmbio não equivalente com a economia privada que garanta à economia de Estado a acumulação das condições extremamente desfavorável de baixo nível técnico às que se tem chegado. Mas todos estes elementos – se se lhes considera globalmente e se lhes inserta no quadro unitário da economia de Estado do proletariado -, estes elementos não são mais que os instrumentos visíveis, a manifestação exterior da lei da acumulação primitiva socialista. Através da luta entre esta lei e a lei do valor, podemos assegurar cada ano (com mais ou menos êxito) uma repartição do sobreproduto do país e uma distribuição das forças produtivas globais capazes de garantir uma certa cobertura para as necessidades sociais por uma parte, e de assentar as bases da reprodução socialista ampliada para o próximo ano (e de um certo modo também para uma série de anos próximos), por outra parte. O equilíbrio de todo o sistema econômico se obtém baseando-se no desenvolvimento antagônico da ação destas duas leis, enquanto que as proporções do desenvolvimento da indústria de Estado e, por conseguinte, o volume das taxas sobre o sobreproduto agrícola que é preciso obter em benefício de um tal desenvolvimento (bem seja debaixo da forma de impostos ou através da política de preços), estas proporções e este volume não são impostos por uma força coercitiva externa.

A eliminação da ação da lei do valor – em quanto reguladora da economia – se produz mediante sua substituição pela função reguladora da lei de acumulação socialista. Deste modo se modificam não somente o método de regulação (planificação em lugar de espontaneidade) senão também o conteúdo material do processo, no sentido de que a distribuição das forças produtivas do país é cada ano diferente de como o haverá sido com a livre ação da lei do valor. Nossa distribuição planificada das forças produtivas está condicionada por outro fim objetivo, que é consolidar e desenvolver o setor da economia socialista: deve, por uma parte e em certa medida, cobrir com seus próprios produtos uma parte das exigências sociais do país, por outra parte, garantir o desenvolvimento, é dizer assegurar um certo nível de acumulação. Mediante tal sistema, as dimensões do consumo social do país terminam estando cada vez mais condicionadas pela ação desta lei. É evidente deste modo que a subordinação progressiva do sistema de intercambio em relação com a regulação planificada (que provém da economia do Estado) supõem uma transformação progressiva – através da luta – desta lei em uma forma de regulação historicamente mais avançada: deste modo, não somente esta lei ficará eliminada senão que se transformará também em uma lei de acumulação socialista primitiva. Tudo isto se produz mediante uma transformação do mercado, posto que a lei de acumulação socialista ataca o conteúdo das relações mercantis, sem modificar todavia sua forma; este processo se estende muito mais rapidamente no seio do setor socialista, e muito mais lento e laboriosamente nos pontos de articulação entre a economia do Estado e a economia privada. Entretanto, a medida que se estende a lei da acumulação primitiva socialista, se começa a poder resolver o problema da proporcionalidade no repartição das forças produtivas (repartição inerente a toda produção social), e a resolver ao mesmo tempo o problema da produção ampliada baixo formas originais que substituem então às formas capitalistas. Não sabemos todavia, no momento atual, quais são as leis que regerão a economia de Estado quando se há alcançado ou superado o capitalismo, é dizer quando a autêntica acumulação socialista comece a existir. Ele dependerá da situação que se tem criado nos demais países que lutam pelo socialismo e em sua construção do próprio socialismo. Não podemos inclusive prever se – devido às relações existentes com o mundo capitalista – o processo de construção do socialismo se acelerará ou, pelo contrário, será detido ou atrasado. Na época atual, quando avançamos em condições técnicas mais retrógradas que as do capitalismo e quando nos encontramos em uma situação de isolamento no seio da economia mundial, a lei de acumulação primitiva socialista é a lei que dirige nosso desenvolvimento e condiciona nossa sobrevivência. A lei deverá obrigatoriamente chegar todo estudo marxista sério sobre nossa economia; a formulará de uma maneira ou outra, mas tratará sobretudo do problema do equilíbrio econômico em nosso sistema em relação com o mercado mundial contemporâneo.

Atrás desta exposição, o leitor poderá dar-se conta de até que ponto as acusações dirigidas contra o autor deste estudo carecem de fundamento. Se lhe há reprovado minar o bloco operário-camponês, transformar a economia camponesa em colônia da indústria socialista, etc. Eu peço a meus críticos, que se consideram marxistas e leninistas, que respondam às seguintes perguntas:

    1- É certo ou não que a produção capitalista ampliada necessita de uma relação proporcional determinada entre as dimensões da acumulação e as do consumo social?
    2- É certo ou não que, no capitalismo, a industrialização dos países economicamente atrasados se encontram facilitada e acelerada pela importação de capital proveniente dos países industrialmente avançados?
    3- É certo ou não que o progresso técnico e o aumento da composição orgânica do capital (que supõe um crescimento do capital constante nos setores que produzem meios de produção e nos que produzem bens de consumo) necessitam um desenvolvimento mais rápido da produção de bens de equipamentos e, por conseguinte, um aumento mais rápido do capital social empregado neste setor, é dizer necessitam ante todo uma acumulação mais rápida na esfera da indústria pesada em detrimento da economia global do país?
    4- É certo ou não que utilizamos já a totalidade de nosso capital fixo e que nos enfrentamos simultaneamente com dois problemas: a satisfação mais rápida das necessidades sociais e a criação de um novo capital fixo, cuja posta em circulação não incrementaria a oferta de mercadorias durante vários anos?
    5- É certo ou não que em um país atrasado economicamente de regime socialista, que não tem conhecido até agora importações de capital e se vê obrigado a lutar contra o conjunto do mundo burguês, o ritmo de acumulação dever necessariamente muito mais rápido que o de um país capitalista que possui um certo nível de desenvolvimento das forças produtivas?
    6- É certo ou não que, em um país deste tipo, o nível crescente de comercialização da economia camponesa exige – com o fim de manter o equilíbrio econômico – um desenvolvimento adicional da indústria, por conseguinte uma acumulação industrial adicional?
    7- É certo ou não que a industrialização de um país com maior razão de um país de regime socialista, exige o aumento do nível cultural e de qualificação da classe operária, é dizer uma alta sistemática dos salários?
    8- É certo ou não que - ademais da acumulação da economia de Estado a partir de sua própria base – a parte de acumulação restante que serve aos gastos da pequena produção não pode ser inferior a um certo mínimo, desde o momento em que lhe tem sido imposto ao Estado soviético por uma necessidade econômica implacável?
    9- É certo ou não, finalmente, uma acumulação insuficiente na indústria de Estado determina uma falta de mercadorias, um incremento dos preços ao menos, uma acumulação de capital privado e uma acentuação das diferenças entre o campo e a cidade?

Nenhum marxista pode dizer que todo isto é falso. E se não lhe é, então é necessário saber utilizar a análise científica de dimensões aritméticas corretas no campo da política econômica para elaborar o plano econômico do país.

Se apresenta ao mesmo tempo como evidente que, se existe no país uma penúria sistemática de produtos (a demanda permanece sistematicamente insatisfeita), se no campo se acumula dinheiro que não pode ser empregado na aquisição de produtos, se os excedentes de cereais se amontoam (convertendo-se deste modo em pasto de ratas e ratos, e permanecendo armazenados durante oito ou nove meses), finalmente se o preço dos cereais se eleva anormalmente no momento da colheita, nos encontramos até a prova experimental de um erro cometido na esfera da distribuição do sobreproduto do país. No momento atual, não é tanto a sobreacumulação senão mais bem a subacumulação o que poderia provocar a ruptura do bloco operário-camponês. Se semelhante situação se prolonga, os camponeses inevitavelmente buscaram aliar-se não com nossa indústria senão com a indústria capitalista estrangeira.

O problema do bloco operário-camponês troca de conteúdo segundo o período histórico. A repetição pura e simples da consigna do bloco não aporta nada ao partido, não nos preserva dos perigos possíveis, e os próprios camponeses denunciam sua inconsistência. O leninismo consiste em dar a esta consigna um novo conteúdo para cada etapa que procede da situação econômica e política, interior e internacional. Na fase que atravessamos, a expressão concreta da consigna do bloco e da aliança se encontra na linha da industrialização do país e de uma acumulação socialista cada vez mais rápida. Tendo em conta a situação deficitária que todos conhecemos, e dado que vivemos abaixo a espada de Damocles constituída pela pressão crescente do mercado mundial, a subprodução industrial e o atraso técnico são os maiores perigos que corremos para o manutenção do bloco operário-camponês.

Em tal situação, todo projeto de analisar honestamente as condições que garantiam a sobrevivência e o desenvolvimento de nossa economia de Estado, como suscita absurdas acusações do tipo daquelas nas que se fala de “colônias”? E não tenderemos talvez motivos para temer que este método polêmico leve consigo em certas condições uma mobilização pequena-burguesa do país contra o socialismo? Se o camarada Goldenberg ou algum outro de nossos jovens “sábios”, que não tenham entrado em nosso partido através da grande escola da luta sem piedade contra o populismo e os mencheviques, podem sofrer a pressão moral de cem milhões de pequenos burgueses e, a causa de sua inexperiência política, deixar-se seduzir pela “anomalia magnética” de Kuban, de Penza e de Kansk, que opinar então de camaradas mais antigos, de velhos bolcheviques que defendem igualmente estas posições e chegam a ignorar as possíveis consequências políticas de seus argumentos? Não se podem admitir que a paixão polêmica das discussões dentro do partido para esquecer os profundos laços históricos e sociais que nos unem. (P.289)

Quisera dizer, em resumo, duas palavras sobre a verificação prática das teses teóricas gerais que tem inspirado ao autor destas páginas desde 1923, e que lhe tem valido tantas críticas acerbadas.

Quando escrevia, em 1924, meu ensaio sobre a lei da acumulação socialista, meus oponentes o que mais temiam era a sobreacumulação e a sobreprodução na indústria. Aplicavam mecanicamente a 1924, e aos anos sucessivos, as lições deduzidas da crise de vendas de finais de 1923, experiência que não compreenderam verdadeiramente e que exageravam a seu gosto. Sua consigna era mostrar-se mais prudente no desenvolvimento da indústria e na acumulação, reduzir os preços ao máximo e não preocupar-se do problema da acumulação. Chegaram apresentar como linha diretriz para o futuro a linha econômica totalmente errônea de “redução de preços primeiro, acumulação depois”, em lugar da única linha possível: “acumulação primeiro, e depois – sobre a base da diminuição de custos – redução dos preços”. Esta consigna referente à acumulação socialista foi posta em dúvida e inclusive considerada como perigosa para o bloco operário-camponês. Quando chegaram os anos 1925 e 1926 com sua pronunciada penúria de mercadorias, com a alteração do equilíbrio entre a cidade e o campo (conseqüência manifesta da subacumulação), se mostrou como evidente que o problema da acumulação socialista que havia proposto constituía o diagnóstico científico da penúria de mercadorias e, ao mesmo tempo, uma advertência, atraindo a atenção do partido sobre o grave perigo que representava a subacumulação, e no momento preciso em que minhas críticas tendiam a conduzir o partido na direção oposta. No momento presente, de nenhum modo podemos deixar em silêncio ou dissimular estes fatos. As premissas teóricas de meus oponentes, unidas a sua incapacidade para aplicar o método leninista à nova situação, tem conduzido a erros práticos no campo da política econômica, enquanto que a teoria da acumulação socialista, que se julgava antileninista, proporcionava – não se sabe por que milagre – um diagnóstico exato sobre as dificuldades que tomavam corpo e que pareceriam evidentes a todo o mundo ano e meio ou dois anos mais tarde.

Se pode determinar a exatitude do diagnóstico dos partidários da indústria sobre outros pontos de nossas divergências. O informe de Trotsky ao XII Congresso do partido foi considerado por alguns como superindustrial; porém, a linha geral de política econômica que se propôs a continuação se tem mostrado perfeitamente justa ao cabo de alguns anos.

No XII Congresso do partido, o camarada Piatakov defendeu a tese do rendimento máximo para os trustes, a condição de manter o nível dos preços ao por maior e o nível dos salários; deste modo propus um regime de economia máxima em benefício da acumulação, enquanto que os camaradas que criticavam sua postura preconizavam o rendimento mínimo. Lançou-se imprudentemente o slogan do rendimento máximo, mantendo constantes as demais condições, como uma defesa dos preços máximos, e se obteve deste modo uma vitória fácil, mas precária. Atualmente, resulta difícil a qualquer pessoa defender seriamente o princípio denominado do “rendimento mínimo”. Pelo contrário, todos os esforços levados a cabo para racionalizar a indústria – esforços que se orientam aos poucos de um modo errôneo, às vezes inclusive de um modo prejudicial – não representam nada mais que um ensaio de assegurar à indústria de Estado um maior rendimento com preços constantes, inclusive menores; dito de outro modo, a aplicação da consigna tão denegrida em 1923.

Por que o camarada Piatakov teve razão e seus oponentes estavam equivocados? Porque ele – como todos os partidários da indústria – defendia a tese justa de uma acumulação industrial mais rápida; tese que, ademais de constituir o diagnóstico da carência de mercadorias e das dificuldades econômicas aparecidos no passo da utilização do velho capital fixo à formação de um novo capital, pressupunha ao mesmo tempo uma concepção global de nossa economia e de suas vias de desenvolvimento mais exata que as de seus oponentes. Esta justa concepção teórica geral conduz ao camarada Piatakov a sacar à luz o problema da direção da economia de Estado concebida como um todo unitário e compreendido todas suas conseqüências em matéria organizativa. Todo este constituí atualmente uma verdade elemental, enquanto que no XIII Congresso do partido os defensores da realpolitik se tinham burlado do camarada Piatakov, tratando-lhe de utopista incorrigível.

Mais tarde, o camarada Trotsky publicou seu artigo “Para o capitalismo ou para o socialismo?”, no qual apresenta baixo a forma mais útil o problema dos coeficientes dinâmicos comparados de nossa economia e da economia capitalista mundial. Esta maneira de apresentar o problema (cuja importância não tem sido todavia suficientemente reconhecida pelo nosso partido) era a única na que a concepção teórica de nossa economia foi cientificamente correta.

Uma justa análise teórica de nosso sistema econômico é extremamente importante para nossa política e para nossa ação prática em geral. Quisera subtrair neste momento a diferença existente entre a economia burguesa e a economia socialista. Na sociedade capitalista, a ciência econômica exerce uma função das mais importantes para quem leva a cabo a produção capitalista. A manutenção do equilíbrio econômico se encontra, por assim dizê-lo, fundado na lei do valor. Esta lei – que é a autêntica lei da ciência burguesa – mantém espontaneamente o equilíbrio do sistema em seu conjunto. Por custoso que se mostre este método de regulação para a sociedade – posto que só a posteriori manifeste os erros cometidos na distribuição das forças produtivas – não é em modo algum suscetível de ser trocada em uma sociedade burguesa. Se o capitalismo monopolista pode alcançar um nível bastante elevado de organização em setores determinados da economia do país, não se encontra em condições, em qualquer caso, de eliminar a desorganização da economia nacional em sua totalidade, e menos ainda a nível do mercado mundial. Pelo contrário, o Estado soviético, que se funda na nacionalização da grande indústria, dos transportes, do crédito e do comércio exterior, se vê obrigado, pelo próprio fato da nacionalização, a defender-se e a atacar por meio de uma forma planificada, abrindo deste modo uma página nova no campo da ciência aos fins da produção. Quanto mais avançamos, mais nos vemos obrigado a organizar a economia planificada através da extensão da ação da lei da acumulação socialista. Mas, para planificar, é preciso também prever. E para prever é necessário analisar continuamente com instrumentos científicos, a uma escala cada vez mais ampla e com uma exatitude cada vez maior, todo o campo visível das causas e as consequências dos fenômenos econômicos. Nossa economia se tem convertido em cada vez mais complexa, sua regulação é cada vez mais difícil e comprometida; se estende a um campo cada vez mais amplo de relações econômicas e compreende uma massa cada vez maior de homens e de valores de uso. Pela centralização de todos os mecanismos de direção os erros possíveis são cada vez mais perigosos. A função dos organismos do plano se converte cada vez em mais importante. Ser um bom político, no sentido geral do termo, parece mais insuficiente que nunca para levar a cabo uma boa política econômica e dirigir a economia de nosso tipo, que é uma economia intrinsecamente socialista. A improvisação e o “diletantismo” se mostram, à medida que passam os anos, cada vez mais prejudiciais. Um regime econômico – se não se reduz a simples detalhes – exige uma diminuição maior da margem de erros na direção. Este último princípio não pode ser aplicado com um esbanjamento mínimo de força mais que em base a uma teoria econômica adequada, é dizer, com métodos mais democráticos e mais acessíveis a quem quer efetivamente aprender e progredir.

Que mudanças observamos neste campo? Após a morte de Lênin não se tem realizado nenhuma elaboração teórica de grande envergadura, capaz de verificar-se a partir dos elementos novos da realidade e de constituir as premissas de uma teoria científica de nossa economia. Todo o que tem sido feito neste sentido pelos partidários da indústria tem provocado uma infinidade de objeções, de acusações de “antileninismo”, de “trotskismo”, de “desvios pequeno-burgueses”, etc.

Atualmente, nada crê já nesta última acusação, e pronto nada crerá tampouco nas anteriores. Mas isto não melhora a situação no sentido de uma participação positiva de nossos oponentes na elaboração de uma teoria da economia soviética. Meus oponentes são muito fortes em matéria polêmica e para encontrar todo tipo de motivos de acusação; mas é preciso, em todo caso, perguntar-se: que argumentos positivos tem posto a minha tese? Os anos passam, se acumulam novos fatos, se renova nossa experiência; mas que se tem aportado concretamente ao partido, no sentido da generalização teórica desta experiência? Nós, bolcheviques, somos uma raça de homens muito exigentes em matéria de teoria; tivemos no passado as obras monumentais de Marx e Engels; atualmente, temos as de Lênin. Com esta herança sobre nossas costas não podemos aceitar o navegar nas enganosas águas de uma economia soviética vulgar.

Meus oponentes não têm aportado apenas nada no campo da teoria. E se pode prever que, se mantêm seus atuais posições de pusilanimidade teórica e de ecletismo, não darão nunca à teoria da economia soviética o que poderiam dar-lhe devido a sua radical autossatisfação. São perfeitamente capazes de escrever artigos, opúsculos, inclusive de redigir livros. Mas não é unicamente isto o que necessita nosso partido e nossa economia no campo da teoria. Com sua negação da lei da acumulação socialista, é dizer, rechaçando o projeto de elaborar uma concepção proletária, marxista-leninista, de nossa economia considerada de modo dinâmica, se tem condenado a esterilidade teórica. Não é acrescentando um pouco de saliva nova ao resmungar dos princípios gerais, inatacáveis e universalmente conhecidos, como se poderá elaborar uma teoria da economia soviética.

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