Se economistas dependessem do INSS, o mundo seria melhor
Blog do Sakamoto, 05/05/2010
Tempos atrás escrevi um texto dizendo que o planeta seria um lugar melhor se comentaristas de economia vivessem de salário mínimo. Pois quando chegamos na época do ano em que se discute o tamanho do aumento do mínimo, alguns deles quase têm um ataque cardíaco. Vendo os lamúrios públicos de economistas sobre a aprovação, pela Câmara dos Deputados, do reajuste de 7,71% para os aposentados que ganham mais de um salário mínimo, verifica-se que o padrão de sofrimento é o mesmo.
(É claro que a maioria dos deputados federais que aprovou o aumento maior do que o proposto pelo governo federal não fez isso por pensar na qualidade de vida de ninguém, mas sim por este ser um ano eleitoral, quando precisam de votos do povo para se elegerem.)
Deu para perceber o suadouro de muitos economistas em entrevistas na TV, implorando para que o governo e os congressistas fossem “racionais”, não “torrando” dinheiro para não aumentar o “rombo” nas contas públicas por conta da Previdência.
Nesta quarta, ouvi um deles dizer que os aposentados “têm que entender” que o país, apesar de estar crescendo, não está sólido o suficiente para garantir um “benefício” dessas proporções. Pelo terno bem cortado do entrevistado em questão, pergunto-me o que ele faria se tivesse que viver com um salário insuficiente para comprar os remédios da esposa doente, ajudar nas contas dos filhos desempregados, acertar o caro aluguel do pequeno apartamento no final do mês e, ainda por cima, ter um mínimo de dignidade. Demagogia minha? Imagine. É simplesmente pimenta nos olhos dos outros virando refresco.
É claro que se as empresas não sonegassem impostos previdenciários ou, na melhor das hipóteses, não empurrassem seus débitos com o INSS com a barriga, haveria mais recursos para cobrir o “rombo” nas contas públicas. Coloco sempre essa palavra entre aspas porque ela tem que ser entendida de outra forma. Previdência não é para dar lucro ou mesmo empatar, não é banco, apesar do desejo de muitos. Deve cumprir uma função social e ser um instrumento para garantia da qualidade de vida. O mais triste é que o receituário econômico tacanho, que mantém a maior parte dos recursos do Estado aplicados para o bem-estar de poucos, foi adotado por todos os governos brasileiros com um sorriso no rosto. Quem depende do Estado que se vire, pois está na contramão da história.
Enche-se a boca para falar dos bilhões a serem gastos a mais, uma preocupação frente à queda de arrecadação no pós-crise. Finge-se ignorar que isso vai impulsionar o consumo de milhões de famílias, rodar a economia e, sobretudo, tornar a vida de uma parcela da população menos sofrida. Mas quando os bilhões são aqueles destinados ao perdão de dívidas de grandes produtores agrícolas ou na rolagem de dívidas industriais, reina o silêncio. Ou pior, o apoio deslavado.
Como já disse aqui anteriormente, há estudos que apontam que o PIB brasileiro comportaria um aumento até maior tanto do mínimo quanto da Previdência, desde que houvesse uma distribuição real de renda, de direitos e de justiça. Ou seja, redução da desigualdade. Alguns perderiam para muitos ganharem. Da taxação de heranças seguindo um modelo americano ou europeu, passando pela cobrança de altos impostos sobre grandes fortunas, pelo aumento no imposto de renda de quem ganha bastante, até a reforma para um Estado que garanta “Justiça fiscal”, considerando que, proporcionalmente, os muito ricos não pagam o devido imposto no Brasil, há muito o que se poderia fazer. Poderia, porque colocar isso em prática está no campo da ficção científica.
Muita gente que ajudou o bolo a crescer não recebeu nem a cereja, quanto mais uma fatia decente. A verdade é que muitos deles continuarão sendo homens-placa nos centros das grandes cidades ou empregadas domésticas, mascarando aquela dor insuportável nas costas contraída ao longo de décadas passando roupa para terceiros. Na hora em que deveriam estar aproveitando um pouco mais a vida.
Contentam-se em saber, pela TV, que médicos de alguma universidade nos Estados Unidos descobriram que faz bem para a saúde trabalhar na terceira idade.
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