Para Ipea, gasto público é insuficiente
Mauro Zanatta, de Brasília
Valor Econômico- 04/05/2010
Mesmo com a recente evolução do Orçamento, os indicadores de saúde seguem descolados do volume de gastos. Um dos mais importantes índices do setor, a mortalidade infantil tem registrado expressivo recuo. Entre 1994 e 2008, a taxa passou de 38,2 para 19 óbitos por mil nascidos vivos. Mas o ritmo de redução dessas mortes precoces na gestão Fernando Henrique Cardoso supera em dobro, até aqui, o período do governo Lula – 57% a 24%.
O sintoma mais grave é persistência de diferenças regionais e raciais no índice. As crianças pobres têm mais que o dobro de chance de morrer do que os filhos dos ricos. E negros e índios morrem mais do que brancos, segundo o Ministério da Saúde. Nesse quesito fundamental, o Brasil figura em terceiro lugar no ranking da América do Sul, atrás de Bolívia e Paraguai, aponta o Fundo de Populações das Nações Unidas (Unfpa).
“Eliminamos seis doenças e temos outras 11 próximas de acabar. Temos atuado fortemente e o cenário favorece a redução de doenças com peso significativo sobre a mortalidade infantil”, afirma o diretor de Vigilância Epidemiológica, Eduardo Hage.
A baixa velocidade da queda tem outra explicação. O Brasil aplica apenas 3,6% do Produto Interno Bruto (considerado todo o setor público e não apenas o nível federal) em recursos públicos na saúde. “O nosso gasto público é muito baixo para uma cobertura universal e integral”, diz o especialista do Ipea, Sérgio Piola. Estudos do instituto estimam a necessidade mínima de 6,5% do PIB. O gasto per capita do Brasil, de US$ 367 anuais, supera apenas Paraguai (US$ 131) e México (US$ 327). Quando somada a despesa privada, o gasto do PIB sobe a 8,4%. Nos países da OCDE, onde os sistemas são universais e as fontes públicas superam 70% do gasto, as despesas são próximas de 9%. Nos Estados Unidos, o índice supera 15% do PIB. “Somos o único país de sistema universal onde o gasto privado é maior do que o público”, diz Piola.
A desigualdade dos gastos influencia os indicadores. Embora tenha sucesso na vacinação e no controle da aids, falta muito para fazer. Um exemplo é a taxa de mortalidade por doenças transmissíveis, outra das principais medidas da saúde. Em 1990, a taxa era de 59,3 óbitos por 100 mil habitantes. Em 1998, recuou a 52 óbitos. Mas entre 2003 e 2006 aumentou quase 4% – passando de 47 para 48,8 óbitos. O indicador regrediu oito anos, voltando aos mesmos níveis de 1999 em doenças imunopreveníveis, respiratórias agudas, intestinais e vetoriais, além de tuberculose, meningite, septicemia, raiva e aids. O Ministério da Saúde defende uma melhora no índice. “Em 1980, essa era a terceira causa de óbitos no país. Em 2008, caiu para a sétima”, afirma Hage.
Mas doenças identificadas com pobreza e subdesenvolvimento, como a leishmaniose visceral, ainda resistem no país. Em 19 anos, até 2008, a incidência da doença subiu de 1,3 para 1,8 casos a cada 100 mil habitantes. A leishmaniose está entre as três enfermidades “cíclicas”, admite Hage, sem tendência de redução no país. Outra delas é a dengue, doença de maior visibilidade nos dois últimos anos. Desde a explosão de casos em 2002, a dengue vem registrando sucessivos repiques desde 2006. Neste ano, os casos da doença cresceram 72% nos primeiros 70 dias, segundo o Ministério da Saúde. Foram mais de 227 mil casos no país. “Mas reduzimos em 30% os casos graves sobre 2009″, diz Hage.
As taxas de hanseníase recuaram, mas ainda estão em 2,19 casos por 10 mil habitantes. Os registros de tuberculose mantêm-se acima de 37 casos por 100 mil habitantes desde o início da década de 1990. E as mortes por diarreia em crianças até cinco anos tiveram forte recuo entre 1990 e 1999. Mas houve um freio no ritmo de redução desde 2000. O SUS ajudou, mas está longe de equiparar os índices brasileiros a níveis aceitáveis.
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