Uma garagem do Grupo Amaral (foto: Agência O Globo) |
A "assunção" no Grupo Amaral não é para pô-lo a serviço dos trabalhadores, muito menos resolver os verdadeiros problemas de transporte em Brasília
por Almir Cezar
Nesta segunda-feira, 25/02, o Governo do Distrito Federal (GDF) realizou algo pouco usual, pôs os serviços das empresas de ônibus do Grupo Amaral sob "assunção", um termo técnico para intervenção na empresa (ver matéria abaixo da Agência Brasil). O problema deve ser maior do que o anunciado, senão o governo não interveria - a ação inclusive pode inclusive mascarar isso. Apesar da fortuna da família Amaral, o serviço acumula gravíssimas falhas a muito tempo. De fato, a assunção não se configura como uma intervenção, muito menos a necessária, e ainda o GDF perdeu a oportunidade de resolver o problema dos trabalhadores, funcionários e usuários, do sistema de transporte da capital do Brasil.
O Grupo Amaral agrupa 3 empresas de ônibus que operam no Distrito Federal (DF) e em municípios de Goiás, representando um dos principais grupos de transporte de passageiros na região. Nos últimos anos, apesar da fortuna dos maiores controladores, Valmir Amaral e famílias, a empresa acumula dívidas, greve dos funcionários por falta de pagamento, multas e reclamações dos usuários. Porém, mais do que a montanha de problemas, a assunção também pode ser para dar exemplo aos demais empresários de ônibus, que "eles tem que maneirar", pois o próprio Governo também não descartou outras intervenções, à medida que, as empresas no DF estão visivelmente sem condições mínimas de rodar, mesmo pelo péssimo padrão brasileiro.
As empresas de ônibus do DF nos últimos meses vêm sistematicamente bloqueando e boicotando um processo de licitação do governo para instituir um sistema integrado de linhas de ônibus, chamado de "tronco-alimentada" e por "bacia", semelhante aos BRT (em inglês, "bus rapid transit") ou BRS ("bus rapid service"), no qual haveria linhas principais ligando terminais e o território do Distrito Federal seria dividido em "bacias", onde cada empresa ao invés de administrar linhas, cuidaria de um trecho do território, alimentando os terminais. O modelo, embora repita a lógica rodoviarista e privatizada, muito lucrativo aos empresários, tenta ampliar na racionalização e uma gestão unificada dos sistema, que, contudo, implica em grande mudanças para as empresas, que esses mesmos empresários não têm recursos de investimento para isso ou simplesmente não estão dispostos a aceitar.Vale lembrar que, o próprio GDF proibiu que a TCB (Transportes Coletivos de Brasília, a empresa pública de ônibus), reconhecida pela população por sua qualidade, pudesse participar dessa licitação, inviabilizando-a como empresa, limitando-a operar no futuro meramente "linhas especiais", sem definir o que seja isso.
As empresas de ônibus do DF nos últimos meses vêm sistematicamente bloqueando e boicotando um processo de licitação do governo para instituir um sistema integrado de linhas de ônibus, chamado de "tronco-alimentada" e por "bacia", semelhante aos BRT (em inglês, "bus rapid transit") ou BRS ("bus rapid service"), no qual haveria linhas principais ligando terminais e o território do Distrito Federal seria dividido em "bacias", onde cada empresa ao invés de administrar linhas, cuidaria de um trecho do território, alimentando os terminais. O modelo, embora repita a lógica rodoviarista e privatizada, muito lucrativo aos empresários, tenta ampliar na racionalização e uma gestão unificada dos sistema, que, contudo, implica em grande mudanças para as empresas, que esses mesmos empresários não têm recursos de investimento para isso ou simplesmente não estão dispostos a aceitar.Vale lembrar que, o próprio GDF proibiu que a TCB (Transportes Coletivos de Brasília, a empresa pública de ônibus), reconhecida pela população por sua qualidade, pudesse participar dessa licitação, inviabilizando-a como empresa, limitando-a operar no futuro meramente "linhas especiais", sem definir o que seja isso.
Em verdade, o GDF é forçado a tentar implantar essas mudanças no modelo simplesmente porque o atual sistema está se auto-inviabilizando a um ponto perigoso para o restante da própria burguesia da cidade, devido aos engarrafamentos infernais e os custos de transporte para suas cargas e mesmo de seus funcionários. Por sua vez, a expansão da especulação imobiliária em várias regiões torna-se inviável pelos trânsito carregado e pela dificuldade de acesso pela carência do transporte coletivo. E ainda, afeta a circulação da burguesia em seus carros particulares, como na próprio negócio da venda desse bem.
Em geral, as empresas rodoviárias de passageiros no DF não conseguem mostrar nem requisitos mínimos para participar da licitação do novo modelo de concessão rodoviária do DF, e nos últimos tempos seus serviços ainda pioram mais. É rotina, ao transitar pelo DF, além da superlotação, ver dezenas de ônibus sujos e quebrados espalhados pelas vias, não cumprir horários, mudar rotas ou simplesmente não circularem de madrugada. Há ainda denúncias que para se capitalizar, ou mesmo boicotar o processo de licitação, as empresas estão vendendo ou transferindo suas frotas para cidades do interior goiano, disponibilizando por aqui uma frota velha ou quebrável e abaixo da quantidade mínima. Há denúncias ainda de que há um "kit" em que maquiam os ônibus nas vistorias do Detran, e até mesmo põe para circular ônibus clone dos que conseguem regularizar. Há constantes atrasos dos salários e dívidas e débitos trabalhistas em aberto. Há no caso do grupo Amaral uma briga judicial aberta entre os sócios, em que cada um, quer se livrar da montanha de dívida que se transformou a empresa, e credores acionando as empresas, exigindo pagamentos.
Por sua vez, há muitas outras empresas em situação igual, ou mesmo pior que a do Grupo Amaral. A própria mídia burguesa cita casos das empresas do grupo Viplan, sob o controle do megaempresário e fraudador Wagner Canhedo, ex-dono da falida VASP, e do mandante de assassinato condenado Nené Constantino, dono da empresa GOL. Porém, o GDF assegurou que por hora não irá fazer novas intervenções, e ainda colocou o próprio megaempresário e vice-governador Tadeu Felipelli (PMDB, ex-rorizista e ex-arrudista), como responsável por coordenar a ação integrada de intervenção, um sinal claro para tranquilizar o empresariado que isso não se multiplicará, a menos que não se repita os fatores que levaram a essa intervenção. Contudo, não deixa de ser um gesto de força, e inclusive pode ser que o problema sendo ainda muito mais grave; risco inclusive de decretação de falência pela Justiça, obrigou o GDF se prevenir a um grande caos em consequência a quebra de uma dessas empresas, infelizmente centrais ao sistema.
Com a assunção, apesar do aparato policial usado na manhã desta segunda-feira, o GDF passa apenas a administrar o serviço das respectivas linhas, que curiosamente são dela própria, o chamado "Poder Concedente". Para operar, o GDF através da DFTrans (empresa pública reguladora do transporte coletivo) requisitou os funcionários do Grupo Amaral, os ônibus, as garagens, etc da empresa. A tal "assunção" é apenas a intervenção na gestão das atividades permissionárias em mãos da empresa, no qual, o GDF para efetivar isso assume apenas o controle das atividades, mas não a posse dos recursos da empresa. E pode no futuro devolver os bens e linhas para os antigos donos do Grupo Amaral, sem prejuízo para eles. Ou mesmo pior, dar brecha para que essa empresa, ou outras que venham estar na mesma situação, exijam (e consigam) indenizações na Justiça. Isto é, a empresa continua proprietária dos bens e recursos da empresa, embora as atividades fique na mera supervisão direta pelo Governo, e por conseguinte poderá exigir compensações.
Na verdade, o GDF deveria ter cassado as permissões do grupo Amaral, e as transferindo para a TCB, contratando por decreto os ex-funcionários do grupo Amaral e arrastando sem indenização (até devido suas dívidas) os veículos, equipamentos e garagens. O GDF teve a oportunidade fazer isso agora, mas segue preservando e mantendo funcionando uma empresa insustentável e maléfica à população. Há uma questão de fundo por trás disso, a insistência no modelo privatizado e rodoviarista no transporte público de massa. O modelo rodoviarista dá enorme lucros à burguesia dona das empresas de ônibus, embora com prejuízos a suas empresas e a seus trabalhadores, e perdas maiores ainda aos usuários e ao trânsito da cidade. Obviamente que também dá enormes lucros às empresas automobilísticas multinacionais, talvez ainda maiores.
Contudo, o transporte público tem a mesma característica econômica dos serviços públicos gerais, como saúde ou educação, para ser eficiente, efetivo e equitativo, pode ser que seja obrigado a operar com margens de lucros ínfimas ou mesmo em déficit, e teria que ter uma escala de operação tão grande, tão grande, que seria inviável que não se constitua sob forma de um monopólio público. Por isso que mesmo na teoria burguesa muitos economistas afirmam que este deveria ser gerido pelo Estado, ou sob fortes subsídios públicos, que o inviabilizariam sob operação e gestão privada e atomizada. Mesmo nos EUA, conhecido como bastião da livre-iniciativa, na maioria de suas cidades, seus sistemas de transporte público são estatais e em muitos países europeus, o transporte coletivo é pago através do caixa dos impostos e não pelas tarifas.
Porém, no Brasil se consegue que se viole esse princípio da teoria econômica. As empresas privadas de ônibus obtêm altos lucros, apenas porque, além das altas tarifas, estão cercadas de isenções de impostos e subsídios ,e mesmo de socorro direto dos governos, além da proibição da entrada de outras empresas ou mesmo do assim chamado "transporte alternativo" ou "pirata". O fato que o transporte alternativo ser tratado com tamanha repressão pelo Estado e ser passível de confrontos inclusive armado entre seus "empresários", semelhante à máfia ou tráfico de drogas, demonstra o quanto é lucrativo o mercado de transporte de passageiros em nosso país. Por sua vez, o acúmulo de riqueza dos empresários é tão descarado, em detrimento muitas vezes até da própria empresa, que a própria mídia, em um gesto também pouco usual, arrolou o patrimônio pessoal milionário do Valmir Amaral, dono de mansões, iates, carros superesportivos e organizador de megafestas.
E tal estado de coisas se sustenta apenas porque os empresários de ônibus estão entre os principais financiadores das campanhas dos políticos nas eleições e nos maiores pagadores de propinas aos corruptos. Em Brasília mesmo, o próprio Valmir Amaral, principal controlador do Grupo, denunciou na época do escândalo do governador Arruda, que os empresários de ônibus da cidade pagaram uma "caixinha" milionária aos deputados distritais para aprovar uma lei de passe-livre que favorecesse as empresas, que continua em vigor.
Outra coisa crítica no atual modelo é a ausência de uma hierarquia viária entre as matizes de transporte de passageiro, onde o transporte sobre trilhos são troncais e, por sua vez, alimentadas por outras formas, do ônibus articulado, até vans e mesmo bicicletas e locomoção à pé. Portanto, além da estatização do sistema de transporte, através da expropriação das empresas de ônibus com transferência à empresa pública TCB, deveria haver um transformação estrutural profunda do sistema de transporte, com a priorização da modernização e expansão massiva do metrô, construção de linhas de VLT (Veículo Leve sobre Trilhos, um espécie de metrô leve de superfície, que lembra os antigos bondes) e de terminais de integração multimodal, acrescido do barateamento das passagens e até a construção de ciclovias e melhoria de calçadas.
Porém, o mais importante é colocar o sistema sob a lógica dos trabalhadores do sistema de transporte, tanto funcionários, como usuários. Isso só é possível pela transformação da própria gestão do sistema, colocando-o sob a gestão democrática dos trabalhadores, sem a interferência da posse e das vontades dos patrões. Somente aqueles quem usam e trabalham sabem como funciona bem algo. Entendemos infelizmente, que no governo Agnelo Queiroz (PT, ex-PCdoB), como em qualquer governo à frente do DF e dos demais entes do Estado brasileiro não será possível, à menos que haja uma transformação radical no própria país. E que tenhamos uma governo governando não para "todos", mas sim para os trabalhadores e pelos trabalhadores.
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Reclamações levam DF a fazer intervenção no transporte público
Agência Brasil | 25 de fevereiro de 2013
O Governo do Distrito Federal (GDF) assumiu hoje o controle, a administração e a operação de três empresas de um mesmo grupo (Amaral) que prestavam serviço de transporte público coletivo na região. A intervenção, inédita na capital do país, foi motivada pela série de reclamações registradas pelos passageiros em relação aos serviços prestados pela Viação Valmir Amaral, Rápido Veneza e Rápido Brasília Transportes e Turismo e pelo descumprimento de uma série de obrigações recomendadas pelo governo.
A maior parte dos registros feitos pelos moradores de Brasília e do Entorno do Distrito Federal em relação às linhas de ônibus que ligavam cidades como Planaltina, Sobradinho, São Sebastião, Paranoá e Itapoã ao Plano Piloto se referia a atrasos, superlotação, uso de veículos sem manutenção e a falta de renovação da frota.
De acordo com a decisão publicada no Diário Oficial do Distrito Federal de hoje, os empresários estão proibidos de retirar qualquer bem dos pátios, desativar qualquer sistema ou paralisar as atividades de transporte coletivo. A nova administração temporária dos serviços prestados por essas linhas vai aproveitar todos os empregados e colaboradores que já atuavam nas três empresas e os bens móveis e imóveis que eram usados para garantir o transporte na região.
Ainda pela manhã, representantes do GDF vão divulgar mais detalhes sobre a decisão, inclusive sobre o órgão que vai assumir a prestação do serviço e as obrigações que as companhias do grupo Amaral terão que atender.
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