Policial acusado pelo assassinato iria a julgamento no Distrito Federal. Impunidade completa 10 anos.
Erros de procedimento adia julgamento. Movimentos sociais organizam protestos e sofrem intimidação.
Contra impunidade ativistas realizam uma campanha pela internet
• Nesta terça, dia 8 de junho, aconteceria o julgamento do acusado pelo assassinato de Gildo da Silva Rocha, militante do PSTU e dirigente do Sindser, o sindicato dos servidores do Distrito Federal, durante uma atividade de greve.
Em 2000, o então governador Joaquim Roriz, tinha dado ordem de reprimir violentamente a greve dos trabalhadores da limpeza urbana, a SLU, se ela viesse a acontecer. Gildo Rocha, um dos líderes da greve, saiu de casa de madrugada no dia 6 de outubro para uma atividade da greve, votada em assembléia: furar sacos de lixo, para impedir o trabalho dos fura-greves. Policiais a paisana o abordaram e, na perseguição, foram disparados 17 tiros contra seu carro, e um deles o atingiu nas costas.
Para esconder o covarde crime, os policiais afirmaram que Gildo estava em atividade suspeita, e que ele foi o primeiro a disparar. Colocaram arma e drogas em seu carro. A perícia desmentiu tudo, provou que Gildo não tinha consumido drogas, que não tinha feito nenhum disparo.
Depois de 10 anos, chegou-se a afirmar que o próprio Gildo teria responsabilidade em sua morte, por ter tentado fugir. “Eles chegaram de madrugada, sem uniforme e carro oficial e de arma na mão. Quem não tentaria correr?”, pergunta Gleicimar de Sousa Rocha, viúva de Gildo.
O processo cível aberto para responsabilizar o Governo do Distrito Federal pelo assassinato, e exigindo pensão para a família da vítima, também não deu em nada. A família do Gildo e o PSTU entraram com recurso e o julgamento acabou marcado para terça-feira ultima, dia 8 de junho, no Fórum de Ceilândia.
O Assassinato de Gildo Rocha
No dia 6 de outubro de 2000, o militante do PSTU e dirigente do Sindicato dos Servidores do Distrito Federal (Sindiser), Gildo da Silva Rocha, foi covardemente assassinado por policiais civis com um tiro pelas costas. O “crime” de Gildo foi organizar a greve dos trabalhadores do Serviço de Limpeza Urbana, na Ceilândia, cidade-satélite de Brasília. Num país em que o direito de greve é tratado com repressão, o crime do sindicalista foi punido com execução sumária por policiais da 15ª Delegacia da cidade.
Gildo tinha 33 anos e deixou uma esposa e dois filhos, uma menina de um ano e um menino de três. Até hoje ninguém foi punido. A injustiça e impunidade marcam a vida da viúva do sindicalista, Gleicimar de Souza Rocha. “Fiquei com vários problemas psicológicos por conta da depressão, é uma angústia muito grande, pois ainda não tivemos justiça”, afirma Gleicimar ao Opinião Socialista.
Na época, a justificativa apresentada pela polícia para a abordagem do ativista foi que Gildo se encontrava em “atitude suspeita”. No entanto, tal “atitude suspeita” nada mais era que uma atividade da campanha salarial deliberada pelo Comando de Greve um dia antes. Os trabalhadores do serviço de limpeza pública estavam paralisados. A fim de dificultar a ação dos fura-greves, Gildo, acompanhado de dois companheiros, Geraldo Rufino e Edson Sampaio, saíram às ruas de madrugada para furar os sacos de lixo.
Dois policiais civis, armados e à paisana, renderam os grevistas, mandando-os deitarem no chão. Ao ser abordado por homens armados, sem farda ou identificação, em plena madrugada, Gildo tentou fugir. Os policiais perseguiram o sindicalista, atirando. Ao todo, 17 disparos atingiram o carro do ativista. Um deles atingiu suas costas. Gildo morreu uma hora depois.
Os policiais, da Delegacia de Roubos e Furtos, forjaram a cena do crime, a fim de incriminar Gildo. Afirmaram que o sindicalista disparou contra eles, que apenas revidaram. Utilizando os mesmos métodos da ditadura militar no sumiço de corpos de presos políticos, “plantaram” uma arma e um baseado no carro de Gildo. Da mesma forma, aliciaram uma testemunha para corroborar essa fantasiosa versão.
No entanto, exames comprovaram que Gildo não estava drogado e muito menos havia efetuado algum disparo. O próprio inquérito policial identificou a fraude e os dois policiais foram indiciados pelo Ministério Público.
Julgamento do assassinato de Gildo Rocha é adiado
Foram dez anos de espera, de angústia que pareciam estar perto do fim, com o julgamento do policial civil Arnulfo Alves Pereira, nesta terça-feira, dia 8. No entanto, para decepção e revolta de militantes e parentes, o julgamento foi adiado no início da manhã, logo após o seu início.
A promotoria pediu o adiamento por causa de um dos jurados, que trabalha na SLU (Serviço de Limpeza Urbana) do governo do Distrito Federal, onde Gildo trabalhava. Por conhecer Gildo, obviamente, não poderia ter sido listado para fazer parte do júri. Novos jurados serão escolhidos e outro julgamento está marcado para o dia 29 de julho.
A servidora pública Gleicimar Souza Rocha, 40, viúva de Gildo, parecia não acreditar. “Ele trabalha lá há mais de vinte anos. Claro que conhecia o Gildo, me conhece também. Claro que não poderia estar entre os jurados”. Depois, ela perguntou ao jurado porque ele não avisou que conhecia Gildo. “Ele me disse que não sabia que o julgamento era o do Gildo”, afirmou.
Gleicimar conta que, nas últimas semanas, desde que o julgamento foi marcado, “só se fala nisso dentro da SLU. Todos os que conheciam Gildo querem um desfecho pro caso”. Muitos dos amigos de Gildo compareceram ao Fórum, para pressionar contra a impunidade. Eles participavam de um ato na entrada, com faixas, cartazes e camisas, exigindo justiça. Parentes de Gildo também viajaram, para acompanhar o julgamento. “Três irmãos de Gildo vieram de Aracaju esperando que a Justiça fosse feita”, conta Gleicimar.
O protesto na entrada reuniu cerca de 50 militantes do PSTU, sindicalistas do Distrito Federal. Eles foram impedidos de entrar com camisas exigindo justiça. Até mesmo a esposa de Gildo foi impedida. “Estava com uma camisa com uma foto do Gildo e me disseram que não poderia entrar daquele jeito”, conta.
Intimidação
Os manifestantes não puderam entrar com camisas, mas os policiais civis que foram até o julgamento exibiram armas e distintivos. Muitos teriam entrado armados no plenário e fizeram questão de que todos soubessem disso. “Eu estava lá na entrada e um policial que chegava perguntou ‘Pode entrar armado aqui? Porque eu tô armado’. Isso olhando pra mim”, contou Gleicimar. Ela reclama ainda que foi colocada em uma antesala, junto com testemunhas de acusação, tendo de ficar ao lado de policiais, no dia do julgamento.
Cerca de 20 policiais civis acompanharam o julgamento lá dentro exibindo seus distintivos. A tentativa de pressão fez com que até um promotor se manifestasse em plenário. “Há uma exibição de distintivo aqui hoje. Mas nada vai intimidar o Ministério Público.” O promotor lembrou que cabe ao Ministério investiga crimes de policiais e que isso vai continuar ocorrendo. Ao final, um promotor pediu que o próximo julgamento ocorresse em outro fórum, no plano piloto, e não no de Ceilândia.
Do lado de fora, o clima de intimidação era ainda maior, com ameaças. “Nós vamos matar todo mundo”, chegou a dizer um policial. Eles exibiam armas e intimidavam os manifestantes. “Em um momento, todos sacaram seus celulares e passaram a nos fotografar”, conta um dos manifestantes. “Entravam com pente de bala na meia”, conta.
Revolta
A notícia do adiamento foi um banho de água fria. “Eu não entendi nada. Vi eles rindo do outro lado, comemorando. Aí percebi. Mas não podia fazer nada. Não podia chorar, porque não quero mostrar fraqueza nesse momento, não mostrei até agora. E nem podia protestar. Minha vontade foi de gritar, xingar”, conta Gleicimar. Mas ela garante que isso não impedirá de seguir buscando justiça. “Só vai adiar o meu sofrimento, mas não vai conseguir fazer com que eu desista. Meu sonho é ver ele preso”, afirma.
Ricardo Guilen, do PSTU de Brasília, conta que agora, com o adiamento, o partido deve intensificar a campanha contra a impunidade. “Estamos convidando todos os ativistas,, movimentos de Direitos Humanos, Sindicatos, todos, para nos unirmos nessa campanha, até o julgamento de 29 de julho. Não podemos permitir que esse crime do governo Roriz fique impune”, afirmou. Na internet, militantes do PSTU de outros estados começaram uma campanha, trocando suas fotos pela de Gildo. Eles devem manter essas fotos durante toda a semana.
fonte: Opinião Socialista online
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