terça-feira, 2 de julho de 2013

Governo terá que escolher entre as ruas ou mercados. Medo de inflação e meta fiscal limitam concessões às ruas


Enquanto milhares de pessoas ocupam as ruas para pedir melhores serviços de saúde e educação e exigir uma redução das tarifas de transporte público. O mercado financeiro, do outro lado, cobra do governo o cumprimento de metas fiscais e mais rigidez no controle da inflação. A situação cria um intrincado dilema econômico que será um dos grandes desafios do governo Dilma Rousseff no caminho até as eleições de 2014. Embora o ministro Guido Mantega prometa que não haverá cortes de investimento públicos e respeito a meta fiscal e de inflação, os protesto em Brasília exigem mais gastos para saúde, educação e transporte, os quais os mercados competem em recursos.

Segundo economistas-chefes de grandes bancos ouvidos pela grande mídia, temos pressões que a princípio são contraditórias sobre a questão fiscal, embora haja uma convergência na demanda pelo controle da inflação.  A pressão para um enxugamento dos gastos do governo e temores de uma aceleração dos preços de fato limitam as concessões que o governo pode fazer no curto prazo.


No médio e longo prazos, uma solução, segundo eles, seria avançar em "reformas" que economizariam recursos para serem usados em educação e saúde, como a reforma previdenciária ou uma ampliação das parcerias com o setor privado em algumas áreas. Omitindo o fato, que nenhuma alteração até na Previdência Social promoveu melhorias em suas contas, além da perda de direitos e benefícios de seus trabalhadores assegurados, e que as concessões em serviços públicos e parcerias públicos-privados também não trouxeram melhorias e redução de preços aos usuários, além da aumento dos lucros das empresas participantes do procedimento.

Lembram, os economistas-chefes e analistas, que os protestos ocorrem em um momento delicado para a economia brasileira em função não apenas da recente desaceleração do PIB e do avanço da inflação, mas também de condições externas. Com os EUA sinalizando que devem desacelerar seu programa de incentivo monetário, fluxos de capitais de curto prazo que nos últimos anos inundaram mercados emergentes começaram a voltar "para casa", o que tem desvalorizado as moedas desses países - entre elas o Real.

Recentemente, a agência de classificação de risco Standard & Poor's também ameaçou rebaixar o rating (nota) da dívida brasileira, alegando perda de credibilidade e piora das contas fiscais do governo.

Em meio a tais pressões, encontrar uma maneira de responder às manifestações tornou-se ainda mais complicado. O governo Dilma prometeu destinar R$ 50 bilhões para obras na área de mobilidade urbana, além de fazer melhorias nos sistemas de saúde e educação.

A Câmara dos Deputados aprovou a destinação de 100% dos royalties do pré-sal para esses setores. Mas mesmo que o projeto passe pelo Senado, tais recursos só são esperados para o longo prazo - enquanto as demandas por melhorias parecem ser urgentes.

No início do mês, preocupado como impacto da alta das tarifas de transporte no orçamento das famílias de baixa renda, o governo já havia editado a Medida Provisória 617, que zera o pagamento do Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) sobre a receita de empresas de transporte coletivo urbano.

"Isso vale para todas as demandas: consideramos que as desonerações estão de bom tamanho. Se porventura alguma outra desoneração chegar a ser feita, (como) a do diesel, qualquer renúncia será acompanhada de um corte de despesa ou de uma outra tributação para compensar", disse o ministro da Fazenda, Guido Mantega, para o jornal O Globo.

Em meio às manifestações, porém, a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado aprovou um projeto de lei criando o Regime Especial de Incentivos para o Transporte Coletivo Urbano e Metropolitano de Passageiros (Reitup), que expande tal isenção para a aquisição de insumos usados por essas empresas, como óleo diesel, veículos, carrocerias e pneus.

De acordo com o relator do projeto, Lindbergh Farias (PT), se o Reitup for aprovado no plenário, só em tributos federais a renúncia fiscal seria de R$ 4,2 bilhões em 2014 e R$ 4,7 bilhões em 2015.

Não está claro como seriam custeadas tais isenções, mas segundo Mantega, quando necessário o governo preferirá cortar gastos de "custeio da máquina" - e não investimentos. "Há um mês e meio atrás, fizemos um ajuste de 10% no custeio de todos os ministérios. Como não entrou Saúde nem Educação, em outros ministérios o corte foi maior. Aqui (na Fazenda), por exemplo, foi de 20%. E haverá ainda mais cortes em gastos de custeio", disse o ministro.


Para Fabiano Bastos, do Banco Inter-Americano de Desenvolvimento, não há dúvidas de que o compromisso do governo com suas metas fiscais ainda é sólido.

"O perigo de que haja um descontrole das contas públicos não existe", diz Bastos, lembrando que a 'responsabilidade fiscal' foi um dos cinco pontos com os quais Dilma se comprometeu em seu primeiro discurso sobre os protestos.

"Essa não deixará de ser uma prioridade, mas no médio e longo prazo o governo certamente terá de avaliar quais serão suas opções para atender as demandas das manifestações com uma situação fiscal de menor folga."

Para Álvaro Martim Guedes, especialista em Administração Pública da Unesp, ao menos na área de educação, melhorias importantes podem ser feitas com ganhos de eficiência e projetos para aprimorar a gestão de recursos.

"Mas o mesmo não pode ser dito na área de saúde, que ainda não se recuperou totalmente da perda de recursos causada pelo fim da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira, extinta em 2008). E o problema é que orçamento de governo é igual cobertor curto: se você cobre a cabeça, aparece o pé", diz Guedes.

Segundo o especialista, para investir nessa área o governo provavelmente precisará de novas fontes de recursos. "Por que não avançar, por exemplo, no projeto de impostos sobre grandes fortunas?", defende.

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