por Almir Cezar
Evento de entrega do relatório final da CNV à presidenta Dilma.
A grande imprensa reverbera a equivocada lógica da necessidade
de julgar também os 'crimes' dos lutadores antiditadura.
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O Brasil está atrasado, em comparação aos nossos vizinhos sul-americanos, e precisa de coragem para julgar os crimes cometidos por agentes do Estado durante a Ditadura Militar (1964-1985). O atraso demonstra a debilidade da causa dos direitos humanos no país. Não à toa, ainda hoje, vemos pipocar pelo país à fora casos como do Amarildo, e mesmo de juízes e outros agentes públicos se achando "Deus". Mas o mesmo não é válido defender para os supostos crimes praticados pelos guerrilheiros e ex-membros dos grupos armados que lutaram contra Ditadura, como apregoa alguns, e que, deprimentemente, a imprensa corporativa fez eco nos últimos dias.
Pelo simples fato de que, esse lado, ainda naquele tempo, foi julgado e condenado em tribunais de Estado, quando não foi alvo de julgamento sumário, por meio de assassinatos e desaparecimentos. Alguns "sortudos" tiveram no mínimo de amargar anos de clandestinidade ou de exílio. Muitos outros, depois de sofrerem as inúmeras violências descritas com detalhes no relatório de 4 mil páginas da Comissão Nacional da Verdade, ficaram mais de dez anos presos, como foi o caso da própria presidenta Dilma Roussef.
Talvez o pior e mais triste do que essa proposição da imprensa é ver 'cidadãos de bens' defendendo a Ditadura de 64, como vimos também nos últimos dias nos comentários nas redes sociais, nas sessões de cartas dos leitores e abaixo das matérias dos sites de notícias. Usando argumentos como "naquele tempo não havia corrupção" - esquecendo, por ignorância ou mal-fé, que não havia naquele tempo órgãos de fiscalização e controle, imprensa livre para denunciar, etc. Ou brandindo que agora no período democrático haveria um aumento na impunidade dos crimes comuns e hediondos - ninguém se lembra de casos famosos que apenas por ser o criminoso rico ou amigo do regime acabara livre? Isso, a não condenação moral à Ditadura, o não constrangimento em defendê-la, é um dos legados infelizes da não penalização dos criminosos contra a Humanidade desse regime.
No passado, diferentemente do que aconteceu aqui, outro regime ditatorial, o Nazismo e seus criminosos, sofreram duas derrotas que o sepultaram moralmente. A primeira, uma derrota militar, quando perdeu vexatoriamente para a ex-URSS, os EUA e os demais aliados nas frentes de combate. A segunda foi na corte internacional instalada em Nuremberg, antiga cidade sagrada do Nazismo, quando a elite política e militar do regime foi julgada por tribunais constituídos pelos Aliados, pondo à luz seus crimes, mas condenando até mesmo à mortes os crimes de guerra, e mesmo inaugurando o conceito reforçando posteriormente com a fundação da ONU e na Declaração dos Direitos Humanos, de crimes contra a Humanidade.
Por sua vez, os governos das duas Alemanhas pelas décadas seguintes continuaram imputando responsabilidades civis e criminais aos agentes do Estado daquele período, mesmo aqueles que alegavam inocência por "cumprir ordens" - ao contrário de procurar imputar igual responsabilidade aos que enfrentaram até pela via armada (apesar de uma tática equivocada) esse regime assassino.
O que aconteceu ao Nazismo não deu brecha que os combatentes contra esse regime, mesmo àqueles que cometeram excessos que eventualmente vitimaram inocentes, fossem considerados à julgamento ou moralmente condenados, nem mesmo tratáveis igualmente aos torturadores e assassinos de Estado, terroristas investidos de autoridade pública, algozes de crimes contra a Humanidade. Muito pelo contrário, hoje são considerados heróis, pessoas que se levantaram, arriscando ou mesmo perdendo a vida em nome da liberdade da sociedade. Mahatma Gandhi, grande adepto da não-violência, mas que lutou contra o até então mais poderoso império colonial da História, disse certa vez que, nunca a violência do oprimido pode ser comparado ao do opressor.
A grande imprensa reverbera essa lógica equivocada de julgar os "dois lados" não apenas por ser esquecer disso. Mas tentando esconder seus próprios crimes: ter incentivado a derrubada de uma governo democrático, ter apoiado durante anos um regime político criminoso e mesmo ter lucrado enormemente nesse mesmo período com anúncios e concessões de rádio e TV. Tentam colocar oportunisticamente um sinal de igual entre os agentes da repressão e os lutadores antiditadura na tentativa de que a Lei da Anistia não seja revisada e os crimes da Ditadura não seja revelados, para que seus próprios crimes também não o sejam. Portanto, da imprensa corporativa apenas se pode esperar isso. Cabe então ao governo a tarefa de que o relatório da CNV não seja apenas uma peça de "investigação histórica" sem consequência alguma, mas instrumento primeiro de pôr à luz os crimes e julgue de fato esse regime.
Atualizado em 05/01/2014.
Talvez o pior e mais triste do que essa proposição da imprensa é ver 'cidadãos de bens' defendendo a Ditadura de 64, como vimos também nos últimos dias nos comentários nas redes sociais, nas sessões de cartas dos leitores e abaixo das matérias dos sites de notícias. Usando argumentos como "naquele tempo não havia corrupção" - esquecendo, por ignorância ou mal-fé, que não havia naquele tempo órgãos de fiscalização e controle, imprensa livre para denunciar, etc. Ou brandindo que agora no período democrático haveria um aumento na impunidade dos crimes comuns e hediondos - ninguém se lembra de casos famosos que apenas por ser o criminoso rico ou amigo do regime acabara livre? Isso, a não condenação moral à Ditadura, o não constrangimento em defendê-la, é um dos legados infelizes da não penalização dos criminosos contra a Humanidade desse regime.
No passado, diferentemente do que aconteceu aqui, outro regime ditatorial, o Nazismo e seus criminosos, sofreram duas derrotas que o sepultaram moralmente. A primeira, uma derrota militar, quando perdeu vexatoriamente para a ex-URSS, os EUA e os demais aliados nas frentes de combate. A segunda foi na corte internacional instalada em Nuremberg, antiga cidade sagrada do Nazismo, quando a elite política e militar do regime foi julgada por tribunais constituídos pelos Aliados, pondo à luz seus crimes, mas condenando até mesmo à mortes os crimes de guerra, e mesmo inaugurando o conceito reforçando posteriormente com a fundação da ONU e na Declaração dos Direitos Humanos, de crimes contra a Humanidade.
Por sua vez, os governos das duas Alemanhas pelas décadas seguintes continuaram imputando responsabilidades civis e criminais aos agentes do Estado daquele período, mesmo aqueles que alegavam inocência por "cumprir ordens" - ao contrário de procurar imputar igual responsabilidade aos que enfrentaram até pela via armada (apesar de uma tática equivocada) esse regime assassino.
O que aconteceu ao Nazismo não deu brecha que os combatentes contra esse regime, mesmo àqueles que cometeram excessos que eventualmente vitimaram inocentes, fossem considerados à julgamento ou moralmente condenados, nem mesmo tratáveis igualmente aos torturadores e assassinos de Estado, terroristas investidos de autoridade pública, algozes de crimes contra a Humanidade. Muito pelo contrário, hoje são considerados heróis, pessoas que se levantaram, arriscando ou mesmo perdendo a vida em nome da liberdade da sociedade. Mahatma Gandhi, grande adepto da não-violência, mas que lutou contra o até então mais poderoso império colonial da História, disse certa vez que, nunca a violência do oprimido pode ser comparado ao do opressor.
A grande imprensa reverbera essa lógica equivocada de julgar os "dois lados" não apenas por ser esquecer disso. Mas tentando esconder seus próprios crimes: ter incentivado a derrubada de uma governo democrático, ter apoiado durante anos um regime político criminoso e mesmo ter lucrado enormemente nesse mesmo período com anúncios e concessões de rádio e TV. Tentam colocar oportunisticamente um sinal de igual entre os agentes da repressão e os lutadores antiditadura na tentativa de que a Lei da Anistia não seja revisada e os crimes da Ditadura não seja revelados, para que seus próprios crimes também não o sejam. Portanto, da imprensa corporativa apenas se pode esperar isso. Cabe então ao governo a tarefa de que o relatório da CNV não seja apenas uma peça de "investigação histórica" sem consequência alguma, mas instrumento primeiro de pôr à luz os crimes e julgue de fato esse regime.
Atualizado em 05/01/2014.
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