Sustentabilidade: Combate à pobreza, saneamento, melhoria da qualidade de vida e
Monitor Mercantil, 20/06/2012
Se sustentabilidade é a palavra do momento, que une todas as tribos, a interpretação do seu significado coloca em pólos opostos ambientalistas que defendem melhor qualidade de vida a ONGs que defendem a manutenção do status quo, congelando o desenvolvimento sem permitir o acesso de bilhões de pessoas aos ganhos do progresso; de empresas que vêem no apelo verde mais uma ferramenta de marketing a setores financeiros que querem transformar a Economia Verde no mais novo ambiente do cassino global, substituindo as bolhas das empresas pontocom e do subprime.
Para o Brasil, e boa parte dos países em desenvolvimento, é fundamental enfatizar como alternativa mundial a melhoria da qualidade de vida das populações, erradicando a pobreza. Esta visão dominou o documento da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20) que será levado á aprovação dos chefes de Estado e de Governo, para desagrado de muitas organizações não governamentais (ONGs).
Em um evento sobre sustentabilidade com empresários, no Rio de Janeiro, a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, disse que o grande desafio é político. "Estamos saindo do idealismo para o pragmatismo", frisou. Segundo ela, o importante é o foco em ações concretas que coloquem o ser humano no centro de tudo.
O saneamento, acesso a saúde e educação de qualidade são ferramentas nesse processo, como mostram os entrevistados neste caderno especial, que integra as comemorações de 100 anos do MONITOR MERCANTIL.
Outro conceito de muitas interpretações, a Economia Verde também fica apenas na citação geral do documento da Rio+20. Segundo negociadores, o temor era que a Economia Verde levasse à imposição de barreiras tarifárias que possam impedir a comercialização de produtos essenciais na balança comercial brasileira. No passado, a venda de atum brasileiro foi prejudicada devido às barreiras alfandegárias.
Também falta consenso em relação às propostas relativas à transferência de tecnologias limpas, capacitação de profissionais para a execução de programas relacionados ao desenvolvimento sustentável.
Capitalismo é a negação da sustentabilidade
Para o economista Carlos Lessa, ex-presidente do BNDES, capitalismo e sustentabilidade são, a princípio, expressões antagônicas. "A mídia cada vez mais se ocupa da idéia de desenvolvimento sustentável. Mas a combinação do sustentável com desenvolvimento é obscura se reconhecermos que todo desenvolvimento é a ampliação de forças produtivas, culturais e sociais, ou seja, transformações que caminham para a civilização", define.
Já a sustentabilidade, para Lessa, é algo capaz de se manter sem perder capacidade de reprodução. "Sustentabilidade aponta para uma estabilidade profunda. É uma idéia fraca diante de um sistema que funciona com premissas de mercado, segundo as quais a importância e durabilidade das coisas não são levadas em conta", diz o economista
"No século XVIII, até as roupas faziam parte dos inventários das pessoas. Hoje, o vestuário é descartável e se faz esforço para mudar periodicamente até o revestimento dos banheiros das casas. Então, cabe perguntar (sobre sustentabilidade): manter e sustentar os padrões de quem? De alguns ou de todos?", indaga o economista.
Lessa não vê a redução da desigualdade nas definições de sustentabilidade e desconfia que os que estão no topo da pirâmide social não estão dispostos renunciar a certos confortos para melhorar as condições de vida das camadas menos favorecidas.
Sistema se apropria até da negação
Para o economista, na Rio+20 não se diz claramente que "menos consumo de energia só com menos apetite das empresas". Segundo ele, existe na Alemanha, por exemplo, uma lâmpada que pode durar 60 anos, mas não interessaria ao mercado produzi-la.
"O mundo todo depende de energia. A maior de todas é a solar que, na fotossíntese, dá origem a todas as cadeias alimentares. E a energia dos homens é o que impulsiona o desenvolvimento. Também não pode ser esgotável essa energia", frisou, lembrando que o sistema se move escolhendo tecnologias que gastam energia.
"Sustentável é a negação do consumismo, mas o sistema se apropria até dessa negação. Um bom exemplo foram os hyppies, que adotaram as calças jeans surradas como negação ao consumismo. No entanto, a indústria procurou produzir calça jeans desbotada e até rasgada, ou seja, o mercado se apropriou do anticonsumismo", resume, perguntando novamente: "Sustentar quem? O planeta? Se for isso, podemos chegar ao genocídio."
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