segunda-feira, 25 de julho de 2016

Liberalismo e fundamentalismo religioso na Pós-Modernidade

Ensaios sobre Pós-Modernidade de Direita n° 12

Por Almir Cezar Filho

A Pós-Modernidade, à Esquerda e à Direita, marcado pelo sectarismo e irracionalismo, alicerça simpatia e abre terreno fértil inclusive ao fundamentalismo religioso. Porém, não é uma reação ao Pós-Modernidade, mas uma das três principais manifestações ou expressões mais comuns à Direita, tais como o Olavismo Cultural e o ultralibertarianismo econômico (ambos mais tratado aqui nessa série de ensaios). Como nas duas outras expressões, compatibiliza, um extremo liberismo econômico, com proposições autoritárias em termos morais e comportamentos e políticos. Pode contraditoriamente trazer consigo semelhança ao Liberalismo, mas seu Liberalismo, se pode se chamar assim, não é o Liberalismo Clássico e Neoclássico.

O novo fundamentalismo religioso, ao contrário do convencional conservadorismo e o reacionarismo de matrizes religiosas, que historicamente sempre se alicerçaram no plano econômico sob a forma de uma defesa da solidariedade econômica, em um grau maior ou menor, mesmo que restringido na preservação da propriedade privada dos meios de produção e de privilégios históricos a grupos econômicos, sob inspiração do tradicionalismo, não o age assim, pelo contrário. A partir do advento da Pós-Modernidade começa a se verificar uma nova forma de programa político no pensamento Conservador e Reacionário, cujo capítulo econômico estão mais próximo do liberismo econômico. O neoconservadorismo e neorreacionarismo, como o fundamentalismo religioso pós-moderno, em sua ideologia, procura conciliar concepção tradicionalista em termos moral e comportamental e de política com um forte liberalismo econômico. Encontrando inclusive na tradição elementos que apoiem seus pleitos liberistas.
"O regime Talibã foi um modelo mais "puro" do Estado Wahhabista, da Arábia Saudita (...) No front econômico, o Islã Wahhabi sente-se perfeitamente em casa com a desobrigação neoliberal que governa o mundo. Os literalista corânicos são capazes de encontrar passagens em favor do livre comércio, e a delegação Talibã recebeu honras totais quando visitou a sede da Unocal (hoje parte da Chevron), no Texas. (Tariq Ali, 2010).
Para o fundamentalismo religioso, o problema da sociedade burguesa não é o mercado livre ou a propriedade privada, mas a moral e a educação da sociedade.  Curioso, o mesmo diagnóstico do pai do Positivismo, Auguste Comte na metade do século XIX, que os intelectuais pós-modernos tanto combatem). A Queda do Muro Berlim deu a ideia de que o Socialismo é um fracasso. Mas o triunfo do Capitalismo não vem dando a ideia de que se trata de uma sociedade poderosa e estável, mas ao contrário, prestes ao colapso. Evitável ao menos pela purificação - e não pela transformação ou superação como pregam os socialistas. Haveria, portanto, sim uma forte crise moral, a ser tratada por meio do resgate moral e espiritual, pela Religião.

A crítica pós-moderna ao Positivismo e outra vertentes e matrizes da Modernidade pautada no objetivismo metodológico e na interpretação da realidade composta por leis gerais, naturais e universais "caí como uma luva" ao fundamentalismo, a uma pauta calçada nos pilares do Conservadorismo.

Primeiro, como uma reação, à medida que a crítica Pós-Moderna abre ao ceticismo, a religião traz a transcendência perdida à partir da explicação sobrenatural da realidade e traz de volta a totalidade e a universalidade perdida. Em segundo, a religião traz a solução dos perigos do excesso do individualismo por meio do altruísmo e leva ao organicismo, a ideia do todo da coletividade ser não apenas desigual a soma dos indivíduos, mas superior, dados agora na explicação religiosa sob forma da comunidade de fiéis, ou a igreja ou o sobrenatural em sim.

A Pós-Modernidade, à Esquerda e à Direita, é o fundada pelo sectarismo e irracionalismo, alicerçando simpatia e abrindo terreno fértil inclusive ao fundamentalismo religioso, pela ação do fenômeno sociológico da polarização grupal.

O fundamentalismo religioso não se limita ao islâmico, tanto em sociedades islâmicas ou não. No caso brasileiro, uma sociedade de maioria cristã católica, os protestantes neopentecostais, mas conhecidos como "evangélicos", não só eles, mas principalmente grupos deles, tentam na atualidade impor sua visão de mundo, valores e comportamentos. Tentam subvertendo a democracia impor legislação e controle administrativos que violam inclusive as liberdades que protegem a religião deles e dos outros, como também a dos agnósticos e ateus.

Essa nova "inquisição" (contraditoriamente, conduzida por uma minoria contra a maioria e as demais minorias) é culpa das lideranças religiosas, mas preocupa, à medida que os crentes comuns desses agrupamentos religiosos, mesmo as pessoas de maior escolaridade permitem isso. Sabe-se que essas mesmas lideranças sequestraram uma parcela do movimento neopentecostal que incorporava há décadas os setores mais pauperizados e frágeis  da sociedade, exatamente onde o Estado é  mais ausente. Os desdobramentos disso beira a verdadeira barbárie.


Comparativamente, os ocidentais acham o islamismo como uma coisa só, mas é muito similar ao cristianismo com várias vertentes. O ISIS ou Dash (o grupo autodenominado "Estado Islâmico") segue o wahhabismo uma vertente minoritária do islamismo sunita calcada no fundamentalismo, e aberta portanto, a intolerância e fanatismo. O wahhabismo é base também ao Talibã e ao Al-Qaeda. Contudo, o sunismo é maioria religiosa nessas sociedades.


Na Europa, de maioria cristã e/ou agnóstica, o islamismo é uma minoria. Mas cresce nas minorias pobres, nos guetos, em pessoas de perfil de imigrantes e descendentes de imigrantes oriundas de países de maioria muçulmanas.


Já no caso, das Américas, o fundamentalismo tem matriz cristã. Inclusive esta expressão ("fundamentalismo") é norte-americana e referia justamente a certos grupos e posições extremistas assumidas pelas comunidades religiosas protestantes neopentecostais. Contudo, o cristianismo protestante é majoritário nos EUA e Canadá. Porém, não o é na América Latina e Caribe. E as conversões se dão em setores pobres, desruralizados, mas sem tradição protestante. 
Embora o crescimento venha sido exponencial, mas segundo o censo brasileiro nem alcançam 1/4 da população, e o crescimento parece que se estabilizou. Portanto, me preocupa a postura de suas lideranças, seguida acriticamente por uma boa parcela de seus liderados.


Entendendo que a politização e extremização das lideranças neopentecostais se dá para aproveitar, isto é, deliberadamente oportunista, às circunstâncias sociais de sua base de liderados: aculturação rápida na desruralização, favelização/guetização, ceticismo acentuado com as lideranças políticas laicas e baixa intectualização. Vítimas fáceis à manipulação por líderes com má intensão e planos extremistas.


Por outro lado, sem dúvidas, há a ascensão daquilo que Hannah Arendt chamou de "banalização do mal" pelo cidadão comum. Os indivíduos médios neopentecostais, apesar de compor uma minoria, tal como descreveu Arendt, não vêm os indivíduos de grupos diferentes como seus semelhantes; não são compassivos e com empatia às demais minorias e mesmo com os da maioria religiosa.


E, também, por serem justamente um minoria, estão à mercê do fenômeno da "polarização grupal", descrita por Cass R. Sunstein, que facilita um grupo ao extremismo de idéias e opiniões. Similarmente, no outro lado do mundo, ao que acontece com os islamitas dos guetos da Europa. Um grupo ou comunidade submetido a condição de minoria que se vê encara purificada da depravação da contemporaneidade, e exige impor seu estilo de vida ao restante da sociedade local.

A adesão das massas populares ao fundamentalismo religioso contemporâneo é uma reação. O Talibã por exemplo, repressivo e cruel, mas no entanto capaz de restaurar a ordem em um país [Afeganistão] arrasado por guerras civis e com estrangeiros desde 1979. "Quando toda uma comunidade se sente ameaçada, isto só faz reforçar a solidariedade, mesmo frente a total inadequação dos que lutam. Muitos afegãos que detestavam o Talibã ficaram tão ultrajados com as falhas da OTAN e o comportamento de suas tropas que apoiariam qualquer oposição". (...) "O neotalibã está crescendo e criando novas alianças, e não porque suas práticas religiosas sectárias se tornaram mais populares, mas por ser o único refúgio possível para a libertação nacional."

A direção política dos movimentos fundamentalistas religiosas é composta por gente oriundas dos setores e segmentos das classes sociais dominantes tradicionais, porém, marginalizadas na contemporaneidade na própria disputa inter e intraburguesa. O terrorismo islamita é o terrorismo de uma burguesia árabe irrigada pela rendas e lucros do petróleo, é, por sua vez, a resposta reacionária de uma classe que na ausência de potência para se contrapôr à competição imperialista entre as velhas e novas potências, lança mão da barbárie típica do Capitalismo como carta de negociação.

São correntes de uma burguesia menor e da pequena burguesia amedrontada e raivosa, mas também de minorias dos assalariados desorientados. Estão destinados à derrota ou à irrelevância, até porque a proteção vocalista e nacional é uma ilusão muito frágil, até porque o mercado mundial é resultado da competição entre potências dimensões continentais.

Não há solução para os trabalhadores, portanto, na divisão e na dispersão. A nossa estrada não pode ser a do nacionalismo, da xenofobia, nem da divisão religiosa. A disposição com  à diversidade religiosa e filosófica e defesa do laicismo e do secularismo, da liberdade de credo e crença e de opinião e expressão, apenas garantidas no laicismo e secularismo do Estado. O percusso a ser trilhado só pode ser o do internacionalismo de classe, a unidade dos trabalhadores do mundo todo, por uma sociedade superior. A nossa classe é mundial, a nossa luta é pelo Socialismo.

Referências:
  • Tariq Ali. 'Duelo' - Rio de Janeiro. Record, 2010.
  • Hannah Arendt
  • Cass R. Sunstein. A Era do Radicalismo - Elsevier, 2009.
Atualizado por último em 03/08/2016.

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