sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Sem a Reforma Agrária, apesar de arrocho, a inflação abaixa pouco e PIB desse ano deve ser o menor desde 2009

por Almir Cezar, da Editoria de Economia da ANotA 
www.agencianota.com | 01/10/2014

O Banco Central no relatório de inflação divulgado nesta segunda-feira (29/09) baixou um pouco sua estimativa para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a inflação oficial do país - recuou de 6,4%, em junho, para 6,3%, percentual ainda próximo da meta desse ano (6,5%). Apesar de meses de adoção de fortes e duras medidas anti-inflacionárias, que vêm causado colateralmente a queda na atividade econômica. A nova expectativa do IBGE é que o Produto Interno Bruto (PIB) cresça 0,7% - deve ser menor desde 2009, auge da crise econômica mundial.

Enquanto o mundo passa por um deflação, o Brasil continua convivendo com uma pressão inflacionária estrutural, real motivo da persistente inflação interna, impassível de ser remedia por mero uso dos juros. Todas as medidas macroeconômicas ortodoxas, desde ajuste fiscal (corte dos gastos públicos) ou arrocho monetário (elevação da taxa de juros básicas), ao invés de combater a inflação, empurra o país baixa na taxa de crescimento do PIB. Isso continuará acontecendo enquanto o país não fizer de fato a Reforma Agrária.

Inflação alta e crescimento baixo

Se por um lado, a inflação oficial divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) em setembro chegou a 6,51% em 12 meses, encerrados em agosto, portanto acima do teto da meta (6,5%). Apesar da safra agrícola recorde novamente esse ano, segundo os dados divulgados pela Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB), a maior pressão sobre a inflação foi justamente do grupo alimentação, com destaque para as frutas (crescimento em uma mês de 2,3%), mostra inclusive pesquisa da FGV.

Nos últimos 6 anos, a inflação no Brasil é maior do que média mundial e maior do que a mediana mundial em nove anos. Pelo mundo, acontece de fato uma deflação (queda perigosa nos preços).

Por outro lado, a economia brasileira deve ter este ano o pior desempenho desde 2009, segundo estimativa divulgada nesta segunda-feira (29) pelo Banco Central. De acordo com o relatório de inflação, a expectativa é que o Produto Interno Bruto (PIB) cresça 0,7% em 2014 – menos da metade da previsão anterior, de 1,6%, sendo que a previsão original do governo era crescer 4% em 2014.

A Selic passou por um ciclo de nove altas seguidas, até abril, quando foi ajustada para 11% ao ano. Em maio, julho e setembro, o Copom decidiu manter a Selic em 11% ao ano.

Armadilha macroeconômica

Apesar do desenvolvimento econômico do últimos dez anos, o Brasil ainda está em um círculo macroeconômico vicioso.  Uma "armadilha macroeconômica". Toda às vezes que a economia cresce, elevasse a inflação forçando o governo combatê-lo. Situação típica das economias dependentes, obrigadas a fixar alta sua taxa de juros para compensar o déficit externo recorrentes (tentar atrair capitais para cobrir a diferença) e combater sua persistente inflação alta.

Contudo, o efeito da taxa de juros alta pode ser oposta da propagandeada pelo BC (Banco Central). Sua elevação pouco influi ou mesmo ajuda a puxar para cima os preços, e portanto a inflação, devido a uma combinação dos efeitos estruturais, cuja origem reside em peculiaridades herdadas do desenvolvimento da economia brasileira.

Juros altos limitam o investimento e consumo, logo desestimulam o aumento da oferta da produção. A economia brasileira é extremamente oligopolizada (poucos e grandes produtores). E os juros altos ainda elevam a renda de uma pequena parcela da população, que justamente não é impactada pela inflação.

Inflação dos alimentos, oligopólios e agronegócio

Na verdade, o problema central da inflação está na inflação dos alimentos. Enquanto a inflação em 12 meses foi de 6,8% ao ano, a inflação do grupo alimentos foi de 23%. Desde 2012, especialistas e o governo olham com atenção para o arroz e o feijão, os vilões da inflação dos últimos anos. Algumas medidas, como aumento dos estoques reguladores de arroz, reajuste do preço mínimo do feijão e mais crédito para os produtores do grão vêm sendo debatidas pelos órgãos públicos ligados ao setor de abastecimento, para estimular a produção desses grãos, desde então pouco avançou.

O último Censo Agropecuário IBGE, de 2006, mostra que a solução para a alta dos alimentos no Brasil é um grande desafio político, pois passa pela adoção, pelo poder público, de medidas estruturais que têm a ver com a justiça fundiária. Com 30% de toda a área plantada, a pequena produção responde por 70% dos produtos da cesta básica.

Os números oficiais revelam ainda que 87% da produção nacional de mandioca, 70% do feijão, 46% do milho, 34% do arroz, 50% das aves, 59% dos suínos e 30% dos bovinos procede da agricultura familiar. Mas o modelo de política agrícola que prevalece no país desde o período colonial não facilita a vida dos pequenos agricultores. O país optou pela produção de commodities agrícolas para exportação e nunca fez a Reforma Agrária.

Apesar da grande riqueza no campo gerado pelo agronegócio, o impacto é pequeno sobre o Produto Interno Bruto (PIB), o indicador para medir a atividade econômica do país. No cálculo do PIB a indústria responde por 30% e  serviços por 65% do total, enquanto que a agropecuária por meros 5%. E, embora, o PIB seja um bom indicador de crescimento, não é de desenvolvimento, que inclui outros dados como distribuição de renda, investimento em educação, entre outros aspectos.

Outro problema chave na questão da inflação dos alimentos é o poder econômico dos atacadistas e grandes varejistas, setores extremamente oligopolizados. O governo brasileiro, sem fazer o populismo do governo de nossos vizinhos, Argentina e Venezuela, mas também equivocadamente, ao invés de atacar os oligopólios do comércio e do agronegócio, recorrentemente os protege com incentivos ou isenções fiscais - há três anos atrás concedeu redução de Imposto de Produtos Industrializados (IPI) às cervejarias para "impedir" na época um aumento do preço que impactaria na inflação.

Ou mesmo, nada faz para mudar isso quando deixa recorrentemente alta a taxa básica de juros. Embora a taxa básica de juros em alta reduza o consumo, acaba desestimulando novos investimentos produtivos para ampliar a produção e logo aumentar a oferta de bens e serviços, que poderiam reduzir os preços, mas que beneficiariam além dos consumidores, possíveis concorrentes.

Sem Reforma Agrária

Por sua vez, há pouco dias do primeiro turnos das eleições, e num cenário dos piores números de reforma agrária dos últimos vinte anos, o governo federal corre para publicar novos decretos de desapropriação de imóveis para a reforma agrária.

Na sexta-feira (26/09) o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) publicou portaria de criação de 20 novos assentamentos, em 12 estados, que podem beneficiar 1.500 novas famílias. Contudo, a publicação do decreto é apenas o início do processo de criação dos projetos. Estima-se que atualmente haja por volta de 100 mil famílias aguardando processos de implantação ou reconhecimento de projeto de assentamentos.

Enquanto isso esse ano, governo federal destinou de crédito subsidiado no Plano Safra da agricultura patronal R$ 156,1 bilhões, 15% a mais que na safra anterior, a taxa média de juros em 1% (a Selic está em 11%). Em descompasso, para o Plano Safra para a agricultura familiar disponibilizou meros R$ 24,1 bilhões para financiamento dessa parcela da produção agrícola.

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