terça-feira, 7 de abril de 2009

Brasil tem desigualdade "sul-africana", diz estudo do Ipea

Fonte: Brasil de Fato

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) compilou diversos índices sociais, econômicos e ambientais internacionais em um estudo intitulado "Desenvolvimento e experiências nacionais selecionadas: percepções com base nos indicadores comparativos internacionais". O órgão reuniu dados sobre 11 países, que segundo o instituto, servem como parâmetro para analisar o desenvolvimento do Brasil.

As nações escolhidas podem ser divididas em três grupos: os países capitalistas desenvolvidos, também chamados de países centrais (EUA, Finlândia, Espanha e Alemanha); os Brics (Brasil, Rússia, Índia e China), “emergentes” com grande extensão territorial e populacional; e países com estruturas similares à do Brasil (África do Sul, Argentina e México).

O estudo apresenta uma perspectiva dos índices sociais em 30 anos, expondo dados de 1975, 1990 e 2005. Em geral, os indicadores dos países promoveram uma curva ascendente, com a exceção de África do Sul e Rússia. Ambos apresentaram uma piora em relação a 1990, no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).

Entre os 11 países selecionados, apenas Brasil, África do Sul, México e Alemanha reduziram a desigualdade de renda entre os trabalhadores entre 1990 e 2005. O estudo utilizou como medida da desigualdade o índice de Gini, que varia de 0, quando todos os indivíduos possuem a mesma renda, a 1, quando há total desigualdade, ou seja, apenas um indivíduo concentra toda a riqueza do país. Em termos numéricos, o Brasil passou de 0,604, entre 1990 e 1995, para 0,564. no período 2000-2005. Assim, a desigualdade foi reduzida em 7% em 15 anos. O índice brasileiro é quase semelhante ao da África do Sul (0,565), que é o pior índice entre os países avaliados, mesmo com uma redução de 11% em relação a 1990-1995.

A Alemanha foi o país que teve a maior redução de desigualdade (14%) e divide com a Finlândia o posto de país mais igualitário, com um índice de Gini de 0,260.



Metodologia

O técnico do Ipea, Milko Matijascic, que coordenou o estudo, explica que a escolha dos países teve como referência a situação brasileira. “Foi uma escolha dirigida. Optamos por incluir países que servem de referência ao Brasil. Todos eles têm modelos de desenvolvimento que podem trazer ensinamentos, pelo lado positivo e negativo”, esclarece.

Matijascic afirma que os Brics, a África do Sul e os latino-americanos servem como comparativo por terem muitas semelhanças com o quadro brasileiro. Já os países desenvolvidos, são considerados “paradigmáticos, com um capitalismo desenvolvido e com uma rede de proteção social exemplar”.

Apesar de a maior parte dos países apresentar melhora nos índices sociais, o pesquisador afirma que não é correto afirmar que o mundo vive uma “tendência” de desenvolvimento humano. “Não dá para concluir que há uma tendência de melhora, não é correto apontar tendências. Basta ver o caso da África do Sul, que em 1975 tinha um quadro mais promissor do que o atual. Um país avançado pode regredir, e vice-versa”, conclui.

Como exemplo dessa imprevisibilidade, Matijascic cita a Coréia do Sul. “Apesar de não constar no estudo, ela traz um exemplo interessante. Nos anos 1970, o Brasil apresentava um quadro muito mais promissor do que o dela, no entanto, hoje ela é uma nação desenvolvida”, compara.

Outra constatação do estudo que sustenta a afirmação dele é o fato de a maioria dos países ter aumentado o desenvolvimento humano de maneira combinada com o aumento da desigualdade, sobretudo nos Brics. Como principal exemplo desse crescimento desigual, aparece a China. Entre 1975 e 2005, o IDH do país mais populoso do mundo traçou a ascensão mais significativa entre os países relacionados no estudo (46%). No entanto, com a arrancada das práticas capitalistas, a desigualdade de renda obteve um crescimento de 36%, entre 1990 e 2005. Pior que a China, neste quesito, somente a Rússia, que após o fim da União Soviética, apresentou um aumento de 40%.

África-Brasil

Segundo o estudo, o país que mais se assemelha estruturalmente ao Brasil é a África do Sul, mesmo com a piora apresentada pelo último no período analisado. “São países muito parecidos racialmente, com população predominantemente negra e com profundas desigualdades, embora o Brasil tenha apresentado melhoras”, afirma Milko Matijascic.

De acordo com o pesquisador, o principal fator a emperrar o desenvolvimento humano sul-africano é a epidemia de AIDS que o país vive, tal como todos os seus vizinhos da África sub-saariana. O indicador mais alarmante da África do Sul é a expectativa de vida ao nascer. Entre as mulheres, cada vez mais afetadas pelo HIV, ela reduziu de 62 anos, em 1990, para 52, em 2005. A dos homens reduziu de 59 para 50. Nesse aspecto, o Brasil está muito a frente do país africano, já que a expectativa de vida masculina é de 68 anos e a feminina de 76.

O técnico do Ipea indica que as semelhanças entre Brasil e África do Sul não podem ser observadas quando se compara o sistema de saúde dos dois países. “Apesar de os números da saúde no Brasil não serem maravilhosos, são muito melhores do que os da África do Sul. Lá eles não tiveram uma postura pró-ativa em relação à AIDS, como tivemos no Brasil, com a quebra de patentes e até o enfrentamento com a Igreja, realizando campanhas de prevenção”, analisa.

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