terça-feira, 23 de setembro de 2008

Quais os rumos da Crise Mundial. Estamos em um novo 29?

por Almir Cezar Filho

Uma nova crise especulativa mundial iniciou-se no fim de fevereiro de 2007. Quais suas causas? Será que ela antecederá uma recessão mundial? Qual o peso da economia chinesa nesses processos?

A discussão é se estamos em uma crise mundial à vista, a partir da deflagração das crises das bolsas de fevereiro de 2007, que nos últimos meses deu uma engrossada, e a oportunidade ou não que se abre para a luta socialista. O mundo enfrenta simultaneamente uma crise financeira global, uma crise energética global, uma crise alimentar global e as negociações de comércio internacional mais uma vez fracassaram. Com uma grande recessão e crise financeira no centro do Capitalismo.


Cabe agora apenas aos trabalhadores, reconstruindo sua organização, destruída com as crises das direções stalinistas e social-democratas nos anos 1980/90, estar preparada para dirigir a superação socialista da crise.

Um novo 29?

Não acredito que estejamos uma nova crise de 1929 agora. Pelo menos por enquanto. O capitalismo deu sinais de que entrou num ciclo de dependência às economias chinesa, brasileira, indiana e russa. Conseguiu uma contra-tendência com os salários baixos do mercado de trabalho especialmente chinês e os recursos naturais abundantes. Em minha opinião, a instabilidade das bolsas, algo dentro da normalidade. A luta socialista, entretanto, parece ressurgindo atualmente, mesmo com todo o empenho, no Brasil, por parte do governo Lula, para destruir a discussão, e nos governos populistas dos outros países sul-americanos em canalizar para o projeto eleitoral dos líderes.

Temos que acompanhar esses fenômenos, sem perder de vista, as relações de trabalho configuradas neste determinado momento. As relações de trabalho na China com certeza estão trazendo implicações entre o patrão(ões) e o trabalhador em todo mundo, salários mais baixo, flexibilização das leis trabalhistas, precarização do trabalho. Enfim, penso ser esse um dos gatilhos para uma nova luta socialista de forma mais organizada (ou de forma instintiva, quando estiver ferindo as próprias condições de sobrevivência dos indivíduos), à medida que o absurdo contra o trabalhador for se agravando. Mas a luta socialista já está aí... está em latência. Uma frase de Marx, "O socialismo é um fantasma que se nega a morrer".

Se estivermos próximos de uma severa crise sistêmica, também é outra coisa. Nunca mais haverá outros "1929", mas haverá novas severas crises. Um 1929 pressupõe um correlação de forças e condições econômicas que não se repetiram e o capital aprendeu a lição, criando mecânicos preventivos, porém a lembrança com o tempo passa, e novas condições similares mas diferentes podem se reinventadas.

Contudo, embora não tenhamos um “novo 29”, circunstâncias novas fizeram os capitalistas esquecer ou negligenciar velhas lições. A livre atuação do capital após a década de 1990, com o fim dos Estados Operários burocratizados e o triunfo do projeto ideológico neoliberal (que destruiu no Ocidente plenamente industrializado o Estado de Bem-estar social e na periferia os projetos nacional-desenvolvimentista) e o próprio papel da China criaram condições inéditas ao Capitalismo, e que o capital e os burgueses não estavam familiarizados, e cheios de arrogância puseram-se criar condições inéditas que no passo seguinte precipitaram o Sistema a severos e imperiosos problemas.

Desregulamentaram o mercado financeiro permitindo operações perigosamente arriscadas quando não promíscuas entre bancos, corretoras e empresas. Permitiu-se a commoditização dos alimentos, tratando-os como mercadorias financeiras, abertas a especulação. Fragilizaram via o agronegócio à agricultura familiar. Permitiu-se a volta a dependência exagerada da exportação de petróleo na matriz energética dos parques industriais. Entregaram o setor energético dos países, o setor estratégico como os alimentos, a sanha dos lucros privados e da especulação do mercado financeiro.

E o papel da China no Capitalismo recente

O peso da economia chinesa nesse processo só contribui para a precarização do trabalho no restante do planeta. Trotsky certa vez disse que a “história da humanidade era a história da economia do tempo de trabalho”. O fenômeno da moderna China é facilmente explicada por isso.

O desenvolvimento das forças produtivas produz a redução do tempo socialmente necessário para a produção de produtos, das mercadorias. Os capitalistas investem em novas máquinas, tecnologias e métodos justamente para isso. Com redução do tempo de sua mercadoria, mas com a manutenção no mercado do nível de preço - porque seus concorrentes mantêm o tempo antigo - o capitalista do “tempo novo” consegue ganhar mais com menos.

É assim que é feito com a China. Os capitalistas do mundo todo rumam pra lá em busca de produzir mais com menor custo. A China herdou as forças produtivas planejadas do socialismo que permite uma eficiência econômica maior do que na anarquia capitalista e possui um parque industrial completo, associado a isso a fartura de mão-de-obra (bilhões) e o fato que a ditadura chinesa impede lutas por melhorias econômicas para os trabalhadores, fazendo com que o custo da mão-de-obra seja baixa ou não cresça (acompanhando a dinâmica de valorização das mercadorias) e por sua vez como os preços internacionais são altos (porque os custos são maiores) então os capitalistas se aproveitam da diferença fazendo com que os lucros com a China sejam alto.

A economia do tempo de trabalho deveria ser convertida ou em redução da jornada de trabalho, ou no aumento do salário, ou na produção mais barata de bens pouco acessíveis aos trabalhadores, mas a ditadura chinesa impede isso. Entretanto, o que se vê é que a redução do tempo de trabalho é convertida em mais-valia extraordinária, que é apropriada por um capital mundial cada vez mais carente de lucros máximos, por sua tendência crônica o decréscimo da taxa de lucro.

Um Partido Comunista Chinês tornou-se no fim em um capataz do capital. O capitalismo se tornou dependente da China, transformou-a em fábrica do mundo, como fez no passado com a Alemanha antes da I Guerra. Vamos ver como isso corre.

As guerras inter-imperialistas voltam a ser possíveis

Infelizmente não li “Socialismo e Bárbarie” do István Mézaros. Mas li o "Socialismo e Barbárie" de Rosa Luxemburgo, "O Imperialismo" de Lênin, "Programa de Transição" de Trotsky e por fim "Teses de Atualização ao Programa de Transição" de Moreno, esse mais recente, meados dos anos 1980.

Em todos esses há a questão das guerras inter-imperialistas. Ela não foram descartadas pela História, à medida que inclusive o imperialismo não foi encerrado. O pós-Segunda Guerra apenas criou uma hegemonia e arcabouço econômico e político para assegurar essa hegemonia aos EUA. Por outro lado, os Estados capitalistas haviam aprendido que com guerras desse tipo fragiliza-se sua dominação social sistêmica, abrindo espaço para revoluções socialistas. Havia a URSS e bloco socialista ameaçando ou servindo de aviso.

Mas essa situação histórica mudou. E o capital se expandiu sem fronteiras, embora essas continuem existindo, delimitando os espaços políticos onde cada capital poderia atuar. Assim as fronteiras nacionais e os interesses estratégicos voltam a baile. Somado ao processo de que as nações hegemônicas parecem precisar recolonizar o globo. Invasões e dominação direta de territórios faz-se novamente presente. Como fez os EUA no Afeganistão e Iraque e a Rússia recentemente com a Geórgia.

Acrescido ao fato que surgem novas economias fortes e as antigas fragilizam-se, passando a usar por sua vez a força como meio de garantir essas senis ou infantes dominações. Assim as guerras inter-imperialistas voltam a ser possíveis e inevitáveis num cenário de médio prazo.

O papel da Crise para o Socialismo

Erro freqüente dos socialistas é ver a crise de maneira colapsista. A crise enquanto colapso do capitalismo, que abriria as portas para a revolução e o socialismo. Tal resulta no baixo entendimento de qual papel do trabalho no funcionamento do capitalismo e uma visão equilibrista.

Não sou um "colapsista", adepto de uma interpretação colapsista da Teoria Marxista, uma espécie de vivandeira que fica esperando a morte anunciada do capitalismo, como uma oportunidade exclusiva para implantar o socialismo somente a partir das ruínas da sociedade burguesa. Acredito que as crises são oportunidades históricas para impulsionar a luta dos trabalhadores pela tomada do poder, pois perdem as ilusões e são forçados a reagir diante dos ataques, ao mesmo tempo em que, o capital está fragilizado. Mas devo acrescentar que a luta operária também é a geradora de crises, pois é quem impõe o limite de ação e atuação do capital, até onde pode explorar os trabalhadores.

As crises do capitalismo são períodos chave para a intensificação da luta de classes e aumento de conscientização da classe operária e dos trabalhadores em geral. São momentos que potencializam o desenvolvimento da ação revolucionária.

Mas também, é necessário lembrar, aliás, como Lênin, que “situações absolutamente sem saída não existem”, ou seja, o sistema não ruirá por si de forma automática, sem luta. O capitalismo tem encontrado formas de responder, não só revolucionando os instrumentos de produção, como intensificando a pressão para a flexibilização dos salários e das condições de trabalho, como forma de restabelecer as margens de lucro.

A vitória socialista neste confronto dependerá muito mais do nível de consciência e organização acumulado no passado pelos trabalhadores do que da crise em si. A fraqueza do movimento socialista demonstrará a capacidade do capital em iniciar um novo ciclo de expansão, nomeadamente se cederem aos interesses do patronato, apoiado pela intervenção de classe do Estado. Este confronto dependerá também do grau de consciência, organização e ligação dos trabalhadores aos partidos revolucionários.

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