domingo, 30 de março de 2025

A Revolução e Seus Legados: Mudanças nas Instituições, Mentalidade e Desenvolvimento Científico e Cultural | A ECONOMIA & A REVOLUÇÃO Parte 23


por Almir Cezar Filho

As revoluções não são apenas eventos de ruptura que alteram temporariamente o curso das sociedades. Seus efeitos tendem a reverberar muito além do momento da mudança, impactando profundamente as instituições, a mentalidade social e até mesmo as esferas da ciência e da arte. Nesta seção, vamos explorar como uma revolução molda e deixa legados duradouros nas instituições sociais e políticas, nas mentalidades coletivas e no desenvolvimento das artes e ciências.

Uma das marcas mais tangíveis de uma revolução é a transformação das instituições. Mesmo que uma revolução não atinja todos os seus objetivos, as mudanças institucionais frequentemente persistem e moldam o futuro da sociedade.

quinta-feira, 27 de março de 2025

A Influência das Crises Econômicas nas Transformações Sociais e Políticas: A Dinâmica entre Crise, Reforma e Revolução | A ECONOMIA & A REVOLUÇÃO - Parte 22

Por Almir Cezar Filho

Crises Econômicas: Catalisadores de Reformas e Revoluções

As crises econômicas desempenham um papel fundamental na transformação das sociedades. Elas não apenas expõem as fragilidades dos sistemas econômicos e políticos, mas também funcionam como catalisadores de mudanças profundas, influenciando desde reformas graduais até revoluções abruptas. A forma como uma sociedade responde a uma crise pode determinar seu futuro, seja por meio da adaptação e ajuste das instituições existentes ou pela substituição completa do regime vigente.

Neste artigo, exploramos como as crises econômicas moldam a trajetória das nações, examinando seus impactos na estrutura social e política, além das diferentes reações que emergem dessas situações de instabilidade.

Crises Econômicas como Motores de Transformação

Crises econômicas afetam todos os aspectos da sociedade. Desde recessões moderadas até colapsos sistêmicos, esses eventos desestabilizam governos, aumentam o descontentamento popular e criam oportunidades para mudanças estruturais.

1. Características das Crises Econômicas

As crises podem se manifestar de diversas formas, mas compartilham algumas características comuns que determinam seu impacto:

  • Desestabilização Econômica: Ocorre uma queda na produção, aumento do desemprego, inflação ou recessão severa, deteriorando as condições de vida da população.
  • Descontentamento Social: A piora nas condições econômicas pode gerar insatisfação popular, alimentando protestos e questionamentos sobre a legitimidade das instituições.

Esses elementos criam um ambiente propício para transformações, seja pela via da reforma ou da revolução.

2. Exemplos de Crises como Catalisadores de Mudanças

A Crise Financeira Global de 2008

A crise financeira de 2008 expôs as falhas do sistema financeiro global, levando a um aumento da desigualdade e do descontentamento social. As consequências variaram:

  • Em países como os EUA, surgiram movimentos como o Occupy Wall Street, pressionando por reformas no setor financeiro.
  • Na Europa, a crise impulsionou o crescimento de partidos populistas de direita e esquerda, desafiando o establishment político tradicional.

quarta-feira, 26 de março de 2025

Um Palácio Nunca Construído e um Vazio Urbano Ainda Presente: Niterói e o Palácio da Secretaria-Geral do Governo do Estado nunca construído

Por Almir Cezar Filho

Palácio da Secretaria Geral do Estado do Rio de Janeiro
(Arte digital a partir do fac-símile restaurado da planta-frontal do projeto)

I. O vazio monumental no coração da cidade

No coração histórico de Niterói, um terreno vazio atravessa gerações como cicatriz aberta. Murado, transformado em estacionamento privado, ele marca a ausência de um edifício que deveria ter completado o centro cívico mais ambicioso da antiga capital do Estado do Rio de Janeiro: o Palácio da Secretaria-Geral do Governo do Estado. Projetado em 1911 por Heitor de Mello, em estilo eclético com traços neoclássicos, o edifício seria o símbolo do Poder Executivo fluminense, lado a lado ao já erguido Palácio da Justiça, à Assembleia Legislativa e à antiga Chefatura de Polícia.

O não cumprimento dessa etapa não é só uma falha arquitetônica ou administrativa: é um trauma urbanístico. O que era para ser um conjunto harmônico de prédios públicos de inspiração europeia — nos moldes dos centros cívicos de Washington, Viena ou Paris — tornou-se um monumento à incompletude, à descontinuidade política e à falta de visão urbanística que assola o planejamento das cidades brasileiras. Niterói, infelizmente, é um exemplo emblemático desse ciclo de promessas quebradas.

II. Projetos pela metade, urbanismo pela exceção

Projeto original de Heitor de Mello
 - Planta do arquivo do CREA-RJ
A não construção do Palácio da Secretaria-Geral insere-se numa lógica persistente: a dos projetos urbanos pela metade. Iniciado com entusiasmo pela gestão republicana do início do século XX, o Centro Cívico da Praça da República previa uma praça monumental ladeada por edifícios públicos de função e simbolismo. Ainda na década de 1910, foram erguidos os prédios da Escola Normal, Assembleia Legislativa, Chefatura de Polícia e Palácio da Justiça. Mas a crise econômica pós-Primeira Guerra Mundial, as mudanças de governos e as disputas políticas adiaram indefinidamente a construção do palácio do Executivo e da praça ajardinada em seu centro.

O terreno permaneceu vazio por décadas, enquanto a cidade mudava ao seu redor. Tentativas de "revitalização" urbana — como o Aterro da Praia Grande, o Caminho Niemeyer e, mais recentemente, o programa “Niterói 450” — seguiram a mesma sina: obras inacabadas, mudanças de rumo e zonas centrais transformadas em áreas degradadas ou subutilizadas. Terrenos viram estacionamentos, quadras viram depósitos improvisados, espaços públicos tornam-se privados pela inércia do Estado. Esse padrão parece estrutural, repetindo-se em outras cidades, como no Porto Maravilha, no Rio de Janeiro.

III. O que poderia ter sido: palácio, museu, centro cultural

Caso tivesse sido erguido, o Palácio da Secretaria-Geral teria hoje múltiplas possibilidades de uso. Como sede administrativa, reforçaria a presença do Estado no Centro de Niterói, descentralizando a burocracia da capital fluminense. Como museu da República ou centro de interpretação da memória urbana, poderia reunir e valorizar a história político-arquitetônica da cidade. E como centro cultural, ampliaria o circuito Niemeyer de equipamentos simbólicos, ajudando a consolidar Niterói como polo de turismo histórico e artístico.

Na Europa, projetos arquitetônicos apagados pela história vêm sendo recuperados como forma de reconciliação simbólica e urbanística. Em Berlim, o antigo Palácio Real dos Hohenzollern, demolido no período comunista, foi reconstruído sob a forma do moderno Humboldt Forum. Em Varsóvia, diversos prédios históricos foram reerguidos no pós-guerra com base em registros iconográficos e documentação histórica. Essas experiências mostram que reerguer o que não foi construído pode ser um gesto de recuperação cívica, não um saudosismo anacrônico.

IV. Urbanismo como política, memória como estratégia

Mais do que nostalgia arquitetônica, discutir o Palácio nunca construído é tratar da memória urbana como projeto político. O vazio deixado pela sua ausência é também a ausência de uma ideia de cidade. Em lugar do centro cívico planejado, temos um amontoado de funções desarticuladas: tribunais cedidos, escolas sob pressão, estacionamentos informais, ausência de um marco simbólico da administração estadual.

A reconstrução — ou mesmo a construção ex novo — do Palácio da Secretaria-Geral do Estado poderia ser um projeto piloto de ressignificação do Centro de Niterói. Respeitando o estilo eclético original, atualizado às demandas contemporâneas de sustentabilidade, acessibilidade e multifuncionalidade, o novo edifício poderia reintegrar o Centro ao imaginário da cidadania fluminense. E dar novo fôlego a uma cidade que sempre oscilou entre o vanguardismo cultural e o abandono de seus próprios projetos.

V. O passado como semente do futuro

A história do Palácio não construído revela o quanto o Brasil, e Niterói em particular, são marcados por rupturas de continuidade, descompromissos institucionais e políticas urbanas voltadas mais para o capital fundiário do que para a cidadania. Mas esse passado também é um convite à retomada de projetos com profundidade histórica e ambição cívica.

Construir (ou reconstruir) o Palácio da Secretaria-Geral do Estado pode parecer um gesto simbólico. E é. Mas símbolos importam. Especialmente quando ajudam a articular espaço, memória e função pública. O vazio urbano da Praça da República não precisa ser permanente. Ele pode, sim, ser preenchido com dignidade, história e sentido republicano.


Representação artística de como seria atualmente o conjunto se o Palácio tivesse sido construído.


BIBLIOGRAFIA

quinta-feira, 20 de março de 2025

A Revolução e Seus Efeitos Duradouros: Transformações Institucionais e Impacto na Mentalidade Social | A ECONOMIA & A REVOLUÇÃO - Parte 21

Por Almir Cezar Filho

A revolução é um fenômeno de transformação profunda que não apenas altera a estrutura econômica e política de uma sociedade, mas também provoca mudanças duradouras nas instituições e na mentalidade coletiva. O impacto revolucionário transcende os momentos de ruptura, influenciando a forma como sociedades percebem sua própria realidade e moldam seu futuro. Mesmo quando derrotada, uma revolução pode deixar marcas indeléveis, modificando sistemas políticos, estruturas econômicas e valores sociais.

Este capítulo analisa as consequências das revoluções sob duas perspectivas fundamentais: as transformações institucionais e as mudanças na mentalidade social. Por meio de exemplos históricos, demonstraremos como esses processos se desenrolam e como seus efeitos persistem ao longo do tempo, redefinindo sociedades inteiras.

1. Transformações Institucionais: A Reconfiguração do Poder
Uma das primeiras consequências de uma revolução é a reconfiguração das instituições políticas e sociais. Esse processo pode ocorrer por meio da substituição de regimes, da criação de novas estruturas ou da reformulação de leis e políticas públicas.

1.1. Reconfiguração das Estruturas de Poder
Revoluções frequentemente resultam na ascensão de novos governos e na redefinição das relações de autoridade e governança. Em alguns casos, a revolução substitui completamente o regime anterior, como ocorreu na Revolução Francesa, que aboliu a monarquia absolutista e instaurou a República. Em outros, pode levar a mudanças graduais, mas estruturais, como aconteceu após a Revolução Gloriosa na Inglaterra, que consolidou a monarquia constitucional e limitou os poderes do rei.

segunda-feira, 10 de março de 2025

"Desmascarando a desmascaração": Sobre os absurdos dos críticos à tributação de lucros e dividendos

É o mínimo de justiça fiscal, não bitributação, como alega a ultradireita, a mídia e o mercado

por Almir Cezar Filho, economista


Nas últimas semanas, ganharam força na mídia e nas redes sociais diversas críticas à proposta de tributar lucros e dividendos no Brasil. Argumenta-se, em tom alarmista, que a medida configuraria uma “bitributação”, um ataque ao setor produtivo ou até mesmo uma violação constitucional. Tais posições, no entanto, ignoram aspectos fundamentais da justiça fiscal e da profunda desigualdade que marca o sistema tributário brasileiro. Enquanto trabalhadores e consumidores arcam com pesados impostos sobre salários e consumo, os lucros distribuídos a acionistas seguem isentos há quase 30 anos. Este artigo propõe uma análise crítica sobre o tema, desconstruindo cinco mitos que têm alimentado essa narrativa e defendendo a urgência de um modelo tributário progressivo, capaz de financiar o Estado sem penalizar quem vive do próprio trabalho.

Um dos textos que expressa essa visão crítica à tributação de lucros e dividendos é o artigo de opinião “Desmascarando o absurdo da tributação de lucros e dividendos”, assinado por Ricardo Sayeg e publicado no portal iG. O autor argumenta que as empresas brasileiras já enfrentam uma carga tributária excessiva e que qualquer taxação adicional sobre lucros e dividendos configuraria bitributação, além de ser um obstáculo ao crescimento econômico. Sayeg acusa o governo de utilizar a medida como manobra para cobrir um suposto descontrole fiscal, criticando também a revogação do teto de gastos e defendendo a austeridade e a redução do papel do Estado como alternativas mais “responsáveis”.

Essa visão, porém, parte de premissas equivocadas e ignora a estrutura regressiva do sistema fiscal brasileiro. Uma abordagem progressista e comprometida com o desenvolvimento econômico e a equidade social permite desmontar, com base em dados e comparações internacionais, os principais argumentos levantados contra a taxação de lucros e dividendos. A seguir, analisamos cinco desses equívocos. Vamos, portanto, “desmascarar a desmascaração”: