por Almir Cezar Filho
Resumo
Introdução
No Brasil de 2024-2025, a economia enfrenta um cenário paradoxal. De um lado, há um aumento expressivo nos preços dos alimentos e produtos agrícolas, impulsionado por fatores externos e internos, como a demanda global, eventos climáticos e a especulação de mercado. De outro, a indústria nacional se encontra em estagnação, incapaz de competir com produtos importados e enfrentando dificuldades para expandir sua produção.Essa situação é diametralmente oposta à "crise da tesoura" identificada pelo economista soviético E. Preobrazhenski na URSS, na qual os produtos industriais subiam mais rapidamente do que os agrícolas, prejudicando os camponeses. No Brasil atual, ocorre o inverso: a agricultura domina o crescimento econômico, enquanto a indústria perde relevância, resultando em um novo tipo de desajuste estrutural – a "crise da tesoura invertida".
O objetivo deste artigo é utilizar os conceitos da economia soviética dos anos 1920, em particular a análise de Preobrazhenski sobre acumulação socialista primitiva, fome de mercadorias e desproporções entre setores produtivos, para explicar a crise atual da economia brasileira.
1. O Conceito da Crise da Tesoura e Sua Aplicação Invertida
No contexto soviético da década de 1920, uma crise das tesouras era o específico onde os preços dos bens industriais subiam mais rapidamente do que os preços dos produtos agrícolas. Isso prejudicava os camponeses, pois:
- Eles provavelmente venderiam mais grãos para comprar menos bens fabricados .
- Isso desincentivava a produção agrícola e agravava a escassez de bens básicos.
Para Preobrajenski, esse desastre entre a indústria e a agricultura reflete um problema estrutural do socialismo em transição, onde a produção industrial não consegue acompanhar o crescimento da produção agrícola.
Se aplicarmos essa lógica ao Brasil atual, argumentamos que o país está enfrentando as características opostas :
- Os preços dos produtos agrícolas estão subindo rapidamente , impulsionados por fatores como:
- Aumento da demanda global por alimentos (especialmente soja, milho, carne e açúcar);
- Fenômenos climáticos (El Niño e secas impactando colheitas);
- Custos logísticos elevados (transporte, energia e insumos mais caros);
- Desvalorização do real frente ao dólar, favorecendo exportações agrícolas.
- A indústria brasileira, por outro lado, está com dificuldades de reajustar seus preços e expandir sua produção , devido a:
- Baixo crescimento da demanda interna ;
- Altas taxas de juros restringindo investimentos;
- Concorrência de produtos importados (China, por exemplo) .
Essa probabilidade poderia ser chamada de crise das tesouras invertidas , pois, diferentemente do caso soviético, os bens agrícolas estão se valorizando mais rapidamente do que os bens industriais , tornando o setor primário mais lucrativo e aumentando a pressão sobre a economia urbana.
No Brasil contemporâneo, observamos o fenômeno similar, porém invertido:
- Os preços agrícolas crescem mais rapidamente que os industriais, afetando o custo de vida e a inflação.
- A indústria nacional está enfraquecida, sem capacidade de competir com produtos importados.
- O setor agrícola capta grande parte dos investimentos e incentivos estatais, deixando a indústria em segundo plano.
- Há um crescente descompasso entre a demanda interna por bens manufaturados e a capacidade da economia de produzi-los, levando à dependência de importações.
Essa dinâmica reflete o que Preobrazhenski chamou de "fome de mercadorias", mas aplicada ao setor industrial: o país não consegue produzir os bens manufaturados necessários para equilibrar sua estrutura econômica. Atualmente, são fornecidos pela importados da indústria chinesa.