quarta-feira, 15 de novembro de 2017

'Não há onda conservadora'. População rejeita em consulta armamento da sua guarda

Amplo NÃO à proposta repressiva mostra que há na verdade polarização política e
 uma contraofensiva da ultradireita que pode ser derrotada

(Ensaios sobre Direita Pós-Moderna)

por Almir Cezar Filho

A maioria da população de Niterói, cidade da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, rejeitou em votação organizada pela própria Prefeitura o armamento da sua guarda municipal (ver AQUI a notícia). O NÃO da maioria dos votantes expressa a discordância com teses repressivas, mesmo na criminalidade urbana, como apregoam a ultradireita e conservadores. Demonstra que não há a tal onda conservadora em curso, como propagandeiam a grande parcela da assustada esquerda brasileira. Há sim uma contraofensiva dessa direita avivada. A Esquerda precisa disputar a hegemonia das consciências da população.

A votação

Moradores de Niterói votaram “não” para o uso de armas de fogo pela Guarda Municipal, no domingo 29/10, durante uma consulta pública. De acordo com a prefeitura, 13.478 pessoas foram contra a medida (70,9%) e 5.478 a favor (29,1%). Enquanto isso, 25 eleitores votaram nulo e oito optaram pelo branco.

As urnas ficaram abertas das 8h às 17h e, na votação, foram usadas cédulas de papel onde o eleitor deveria assinalar “sim” ou “não” a pergunta: “Você é a favor do uso de armas de fogo pela Guarda Municipal de Niterói?”. O voto na consulta pública não era obrigatório.

Ao chegar ao local de votação, o niteroiense deveria apresentar o título de eleitor e um documento oficial com foto ao mesário, que consultava uma lista do TRE para conferir se o eleitor estava apto para votar naquele local. Estando tudo de acordo, o eleitor recebia uma cédula eleitoral de papel e se dirigia à cabine de votação.

O prefeito de Niterói, Rodrigo Neves, chegou a garantir que, se a medida fosse aprovada em votação, os moradores já poderiam ver guardas municipais armados em dezembro deste ano. Por outro lado, disse que acatará a decisão do plebiscito - embora um vereador, mesmo em sua base parlamentar, possa propor e a Câmara Municipal aprovar.

Avaliando o voto

Em uma análise geográfica e socioeconômica da apuração mostra que a vitória do NÃO foi em todas as seções, com percentuais muito homogêneas de votos. Isso é uma aproximação, à medida que houve fusões de seções eleitorais daquela do TRE-RJ e o voto foi facultativo, o que complica um pouco as análise. Mas, por outro lado, as seções de votação das eleições regulares também misturam eleitores de níveis sociais muito diferentes, compondo juntos favelas, eleitores que moram em outro bairro, mas se registram ali porque gostam do local de votação.  Assim mesmo dá para avaliar que o NÃO foi majoritário não apenas espacialmente, em todos os segmentos sociais, especialmente na classe social.

Negou certa expectativa de setores da esquerda, inclusive niteroiense. Com isso derruba-se o mito que a classe média brasileira é muito conservadora - ao menos não é caso em Niterói. A classe média, ao contrário que supõe muitos, em sua maioria pelo visto não foi favorável a medida proposta pela prefeitura e defendida por muitas organizações reacionárias.

Essa visão sobre a classe média (classes "A" e "B") emergiu em parcela da Esquerda pois foram os setores sociais que mais se mobilizaram no apoio ao impeachment da presidenta Dilma Roussef e de onde surgiu recentemente várias organizações ultradireitistas.

Contudo, apesar de ser a classe em que prepondera o apoio às medidas bonapartistas, conforme várias pesquisas de opinião qualitativa vêm apontando, igualmente esse tipo de posições se têm apenas 15% de apoio geral, na classe média isso não ultrapassa 50%. Apesar de maior, mesmo assim não é maioria nessa classe.

Ajudou à derrota da consulta uma forte campanha pelo NÃO organizada por várias organizações de esquerda e entidades dos movimentos sindicais e populares explicando os malefícios do armamento de mais uma corporação, cuja competência legal não é igual a das polícias estaduais e da União, e o quando outras medidas adotáveis pela Prefeitura poderiam ser mais eficientes no auxílio à questão da segurança pública na cidade.

Polarização política e Contraofensiva conservadora

O que há sim é uma intensa polarização política do país. Em que a população, tradicionalmente despolitizada e apática, passou a se engajar, ao menos na tomada de opinião, sobre temas políticas e candentes da realidade. Uma parte vai às teses da Esquerda. Enquanto outra às teses da Direita. Em muitos casos até em reação à crise geral e ao caos que esse traz consigo, como também inclusive em reação ao deslocamento da outra parcela que foi à esquerda.

Por sua vez, os setores organizados da direita estão com forte campanha política, constituindo assim uma Contraofensiva Conservadora, em base a erupção de um movimento social pós-moderno de direita. Inclusive a fim de preservar o controle de certos valores sobre o conjunto da sociedade, como dar continuidade o status quo política, cultural e econômico de séculos no país, e que ao seu ver, está ameaçado diante novas circunstâncias sociais que vive nossa sociedade.

A esquerda pós-moderna, o centrismo e o reformismo não têm paciência e não sabem dialogar. Preferem logo taxar, como fazem com a caracterização de suas próprias derrotas políticas eleitorais que há tal onda conservadora, que houve um golpe contra Dilma, etc. Essa esquerda por ter sua própria origem na classe média, e atuar politicamente nela, tem com parâmetro apenas o que ela (a classe média) pensa, enviesando a análise sobre a consciência geral da população brasileira.

Por fim, a atual "campanha de caça" aos direitos sociais e fundamentais praticada pelos políticos e incentivada por organizações de direita, com vasto exibicionismo de um conservadorismo extremo e moralista, na verdade, não tem respaldado na maioria da opinião pública. Pesquisas de opinião sobre temas morais e polêmicos apontam que mesmo no eleitorado evangélico não tem a mesma opinião e votações dos políticos da dita "bancada da bíblia". Essa dicotomia se sustenta porque essa contraofensiva política é bem organizada.

Falta à Esquerda brasileira entender a realidade social atual, ter coragem e se organizar para disputar a hegemonia da população. Não reeditando, portanto, o que a população rejeitou e contribuiu à queda da Dilma e do PT, principal motivo para o descolamento político entre as massas e a vanguarda de esquerda.

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