quarta-feira, 1 de junho de 2011

Entenda a crise econômica em Portugal

O jornalista Marcelo Bernardes ouviu o cientista político português Miguel Soares Domingues que dá sua opinião sobre a grave crise econômica no país europeu. Para ele, a crise não é um desdobramento da crise financeira de 2009 iniciada nos EUA ou da crise da dívida grega de 2010 e sim um reflexo de que em Portugal se constituiu um padrão de desenvolvimento econômico e social dependente, baseado num crédito exterior (endividamento), e que desde 1964 Portugal deixou de ser um país soberano para ser um Estado que se submete a decisões econômicas que flutuam com os mercados financeiros do mundo.

Entenda a crise econômica em Portugal
Marcelo Bernardes, Monitor Mercantil - 23/05/2011


Paris - Corrupção, má utilização de recursos financeiros e de fundos econômicos europeus levou Portugal a uma situação econômica semelhante a que passou pelos anos de 1910. Atualmente, aquele país tem um déficit em torno de 125% do Produto Interno Bruto (PIB), conforme disse ao MONITOR MERCANTIL Miguel Soares Domingues, estudioso do assunto com Licenciatura em Ciências Políticas pela Universidade de Lisboa, Portugal, para quem essa má gestão econômica levou a "jovem democracia portuguesa à bancarrota".



A má utilização de recursos públicos, segundo esse português que vive em Paris há dois anos - fato que vem acontecendo com milhares de compatriotas seus, que estão fugindo para vários países da Europa, inclusive os velhos que estão vendendo suas propriedades e tentando a sorte fora -, não contribuiu "exclusivamente" em nada para as empresas e nem para a população. Gerou apenas, de acordo com ele, a destruição dos setores econômicos (primário, secundário e terciário). Atualmente, diz, Portugal não produz nada, importa quase 100% de suas necessidades. Como exemplo, citou o pescado que, segundo ele, 100% do produto consumido naquele país, assim como toda a logística de distribuição são oriundos da vizinha Espanha.

- Todas as elites políticas se aproveitaram dessas facilidades e se venderam em benefício próprio. Empresas de pequeno e médio porte, que realmente geram empregos, estão fechando em, no máximo, um ano. Isso sem mencionar que cerca de 20% da população ativa portuguesa está desempregada - comentou, ressaltando que o atual PIB de Portugal não pode se medido segundo os parâmetros tradicionais, uma vez que o país "não cria valor agregado em seus produtos (Índice de Valor Agregado - IVA) - "Portugal hoje vive de esmola dos estrangeiros (União Européia). A situação se agravou em função de decisões equivocadas, levando o país a uma forte dependência econômica. Portugal só foi independente economicamente com os regimes autoritários" - lamentou.

Miguel Soares Domingues lembrou que, desde 1974, seu país passou por várias fases econômicas, com destaque para dois grandes períodos. O primeiro, segundo ele, foi antes da integração européia (1981/82), na Presidência de Mário Soares. Antes, porém, a economia portuguesa era estatal. Esse período durou oito anos.

Depois, ocorreu a abertura para os mercados financeiros como forma de integrá-lo no mercado europeu. Com isso, Portugal recebeu ajuda financeira dos países da Europa (França, Alemanha Itália e Grã-Bretanha).

- Do ponto de vista estatal, ocorreu um desenvolvimento econômico e social baseado num crédito exterior (endividamento). Desde então, houve três grandes remessas de dinheiro da União Européia por vários governos progressistas, com base ideológica de centro-esquerda que, em sua maioria estão nos centros de decisões da Europa - comentou, acrescentando que desde 1964 Portugal deixou de ser um país soberano para ser um Estado que se submete a decisões econômicas que flutuam com os mercados financeiros do mundo - "Não tem uma estratégia política e nem financeira para enfrentar essa situação adversa. Apenas estruturou uma estrutura para ganhar votos dos eleitores como, por exemplo, a realização de grandes obras nacionais, estradas, aeroportos, entre outras. Tudo isso resultou num gigantesco espiral descendente".

Como perspectiva para o futuro, Miguel aponta dois caminhos. O primeiro, segundo ele, é o da "cruz", de muito sofrimento. Terá que negar-se a si próprio para ser um país que pode beneficiar o seu povo, ou aproveitar qualquer espaço da política econômica para ver o que acontece. Como forma de achar uma luz no "fim do túnel", o estudioso diz que o governo português precisa lançar mão de meios que não são moralmente bem visto, ou seja, utilizar os mercados financeiros para o bem de Portugal, com prioridade para a produção nacional e ter o assessoramento de profissionais honestos. E frisou que a ajuda financeira do Fundo Monetário Internacional (FMI) só vai gerar mais déficit e inflação.

Nenhum comentário:

Postar um comentário